food, art & spirits

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sábado, 30 de julho de 2011

particularidades, sintonias, disparidades

Saí cantando Heaven, I´m in Heaven, porque fui deliciosamente citado por uma pessoa que escreve muito bem sobre o assunto - Nina Horta, em seu blog. Li seu livro "Não é Sopa" há muito, logo após ter lido "Um Alfabeto para Gourmets", de M.F.K.Fisher. Muito embora tenham formas literárias distintas, escrevem com uma qualidade atemporal sobre um assunto que tinha tudo - no passado próximo - de ser um tema "mulherzinha", mas ambas o fizeram (e no caso de Nina continua fazendo) com um caráter quase masculino, sem frescuras, mas nem por isto de humor e perspicácia reduzidos. Desde que montei este blog, e não faz muito, este é meu segundo aval considerável - o primeiro foi do Bérgamo, carinha que escreve bem e tem umas fotos em seu blog que me irritam, de tão bem tiradas, iluminadas e de composição sempre precisa.
Sei que a diferença de Ego para Cego é apenas uma consoante, e não vou deixar que isto me domine, mesmo porque acho que ainda falta um tanto para chegar aonde quero.
E eu estava em Recife quando vi este post, então a mistura de céuazulmarverde da minha janela, junto com este "evento" e mais alguma coisa, me inspiraram a fazer algo que ela (Nina) me adverte : trabalhar no imprevisto, investir no acaso.  Achei que ninguém queria ver fotos de pratos que deram errado,
ler sobre a receita do bolo que solou ou do jantar equivocado, apesar dos esforços. E vi que contrariava meu próprio dogma, onde afirmo preferir Toddy ao Tédio. Em viagens, o que dá certo é ótimo. Mas o que dá errado e com final feliz geralmente nos municia de muito mais lembranças. Portanto, vamos doravante enfiar o pé na jaca, escorregar no quiabo, pisar no tomate y otras cositas más.
Começando por aqui, em Recife, onde ganhei uma linda cuzcuzeira de alumínio tamanho "coupèe" - instrumentomais do que propício para um experimento.


Nunca tinha feito cuscus pernambucano, com leite de coco como manda o figurino, e desta volta quase que viciei neste prato feito no Parraxaxá (de onde tirei esta foto),
 granulado e soltinho, com a medida certa de sal e açúcar, um pouquinho de leite de coco, e não precisa de mais nada. Tentei pegar a receita direitinho com a simpaticíssima Ruth, cozinheira de mão cheia que, de início, evitou me dar dicas, com o melhor dos argumentos : "...se eu te disser tudo, você para de vir aqui comer minha comida!" Argumentei que, quando eu estiver em Recife, não vou escapar dela, mas quando em Sampa...então recebi as dicas precisas, inclusive da cuscuseira que ela usava, diferente da minha. Esta dá a forma sensual do prato acima e é mais segura, conforme me informou Ruth brejeiramente. Adorei ela.
Óbvio que, ao contrário de minha experiência com o mingau de tapioca citado no post anterior, errei nas quatro duas primeiras vezes que tentei fazer. Da primeira vez a água subiu demais, enxarcou tudo eo que era para ser uma iguaria virou uma coisa mais adequada para calefação e solda de canos e rachamento de diques. Da segunda, virou uma farofa desidratante. Sim, porque a pessoa que se arvorasse a experimentar aquilo ia desidratar subitamente, como num filme de ficção. Na terceira tentativa, quase. O problema do quase é ...o quase. Quase bom, quase ruim, quase com gosto, quase sem gosto. Na quarta tentativa, aí sim, algo próximo ao que tinha comido. Não, ainda não estava igual. Mas estou apenas começando nas diatribes e delícias pernambucanas, ainda não sei fazer a Cartola perfeita (doce de banana com queijo manteiga, açúcar e canela), não sei fazer Caldinho de camarão nem de peixe como eles fazem e considero que queijo de coalho na praia tem, definitivamente, outro gosto, diferente do que levo para casa. Mas todo caminho começa com o primeiro passo. Com a primeira queimadura, no caso. Porque fazer cuscuz não é para qualquer um não, exige elegância, bravura e espírito. Não é comida para fracos, não. Digo isto com 5 band-aids nas mãos.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

naninha, mingau & outras compensações

Não foram duas boas semanas, fisicamente falando. Uma tosse intermitente, chatinha, me levou ao médico. Diagnóstico - infecção das vias respiratórias. Um pouco de antibióticos deram conta do recado, mas em seguida, um mal-estar de proporções bíblicas me levou novamente ao médico em menos de uma semana. Diagnósticos : sinusite e estafa. Pelamordosdeuses, estafa é o diagnóstico mais comum para homens de minha idade que não tem a conta bancária de um Eike ou de um Bill. Mas esta estafinha me derrubou. Não tinha vontade de nada - nem de comer, nem de cozinhar, ler, ver TV, internet, George Clooney, eu não queria nada que não fosse minha cama e os cobertores. Um frio ancestral me dominava e me mantinha preso à cama, um torpor, uma moleza, uma incapacidade até de pensar. O copo d´água ao meu lado, e o braço não queria se mexer, a não ser na última hora. Fora a inapetência, a falta de vontade de tudo.
Aí lembrei que as crianças têm um apoio "moral" nestas horas - a tal da naninha.
Um misto de rito de passagem pela supressão da chupeta, com todas suas óbvias interpretações psicanalíticas, e também uma coisa fofinha para a criança ficar mais calma e segura. Mas não tem para adulto...E eu descobri que eu precisava de uma espécie de naninha, algo simbólico que me acalmasse (e não fosse Rivotril) para que eu tivesse a certeza de que aquele mal-estar era passageiro, de que aquele estado de torpor era temporário e normal sob algumas circunstâncias. Mas como não tinha este objeto para focar minhas deficiências, esperei até melhorar. E esperei, e continuei esperando quase até hoje, quando, pela primeira vez, me senti próximo ao normal. Não deixei de trabalhar quase nenhum dia, mas o tempo em que estava em casa, estava na cama, o único lugar razoavelmente confortável e aconchegante para minha situação.
Mas se o corpo é um universo misterioso, a mente mais ainda, mas atende aos sinais deste primeiro. Hoje trabalhei com mais foco e afinco, e ao chegar em casa, me deu vontade de uma coisa básica, que me levantasse, fisica e moralmente. Nada muito complicado, que me obrigasse a ficar horas na cozinha. Queria um alimento ancestral, que suprisse as minhas necessidades físicas, e que ao mesmo tempo me reconfortasse, afastando-me daquele auto-tédio a que tinha me imposto. O resultado foi uma forma de "naninha" : um mingau. Um delicioso, quente, reconfortante mingau de tapioca, preparado em poucos minutos, mas cuja preparação me provocou excelentes lembranças, de um tempo em que alguém colocava a  mão em minha testa para ver se eu estava com febre, e trazia um chá com torradas e geléia, uma sopinha quente e cremosa, um mingau...
Não foram semanas agradáveis, eu estava enjoado, chatinho e chateado, com uma moleza absoluta e uma inapetência fora do comum para mim. Mas subtraíram fantásticos três quilos de meu peso total, então no final valeu a pena. Já voltei ao blog e à internet, cozinhei, li, vi House, e se o George Clooney aparecer, vai ser muito bem recebido.
 
Mingau de Tapioca
2/3 de xícara de tapioca flocada
2/3 de xícara de água fria
1 e 1/2 xícaras de leite desnatado
1/2 xícara de leite de côco
1 colher de sobremesa de manteiga sem sal
2 colheres de sobremesa de açúcar
1 pauzinho de canela
canela em pó

Coloque a tapioca de molho na água em uma tigela ou prato fundo por aproximadamente 20 minutos. Reserve. A tapioca vai inchar e absorver toda a água. Aqueça em fogo baixo o leite, adicione o leite de côco e o açúcar, a manteiga, a canela em pau e a tapioca. Mexa sobre o fogo baixo por aproximadamente 15 minutos ou até engrossar. Sirva quente polvilhando canela em pó.


terça-feira, 5 de julho de 2011

V E N D E T T A

Almoço hoje não existiu. Tracei uma maçã da Mônica (sim, isto existe, vem num saquinho com a figura da...acho melhor não explicar), um iogurte "série especial" supostamente de mamão e cereais, mas que na verdade era meio cor de mamão - na cartela de tintas da Suvinil -, e umas coisas dentro meio murchas que pareciam asas de algum inseto, tudo mascarado por um sabor de baunilha sintética. Aí abro o Facebook e vejo no meu mural uma foto de Sr. M de um prato de canjica com canela polvilhada, onde ele me provoca dizendo que ela tinha sido recém feita e consumida ainda morna. Raiva. Ódio. Gula. Inveja. Quantos pecados capitais ainda faltam? Aí entramos numa discussão com Lord N pois eu falava que a canjica do Nordeste se chama curau no Sul/Sudeste, nome considerado brega em comparação aos nomes tradicionais do Nordeste Brasileiro. Sou forçado a concordar - canjica é mais nobre que curau. Assim como munguzá, carurú, vatapá, nomes ancestrais. Portanto, discussão definida, até que  Lord N  alega informa ter almoçado foie gras com frutas vermelhas. Raiva. Ódio. Gula. Inveja.
Mas o mundo dá voltas...
No final do dia, a caminho para casa, recebo um telefonema de Sr. B, dono da empresa para qual trabalho, convidando a mim e a Eduardo para jantarmos em sua casa. Uma boa surpresa, e irrecusável, por alguns motivos.
1º) Não recuso jantares do Sr. B e da Sra. D, sempre como e bebo muitíssimo bem, o papo rola solto e a noite é ótima.
2º) Não tinha nada pronto em casa, e não tinha almoçado, lembram?
3º) Não se recusa jantar na casa do dono da empresa para qual trabalha.
Ao chegar na casa, o perfume denunciava. Um tartuffo de aproximadamente 10 cm de diâmetro repousava num prato esperando sua hora de aparecer. A surpresa era um cardápio fundamentado neste fungo subterrâneo, totalmente capitaneado por Sr. B, que se esmerou nos pratos.

Per cominciare - insalatta de Mâche com tartuffo . Simples, clara.

Secondo piatto - Uovo com tartuffo. Um clássico. De novo, simples, fantásticamente simples.A gema laranja, escorrendo sobre o prato, um sal negro defumado. Sabores e aromas casados.
Ainda - uma polenta com ragu de cogumelos, grana padano e tartuffo. Uma pequena ode à caloria. Mas...
E para finalizar o conjunto, queijo branco com mostarda di cremona.
Dizem que a vingança é um prato que se come frio. Não, se come frio, morno, quente, e com tartuffo.
Sr. M volta a me provocar nesta rede social afirmando declarando que após a academia, Pilates e esteira comeu apenas frugais frutas. E eu cheio de vinho e calorias.
Acho que ainda devo uma vingança - ele deve estar magro a esta altura. Três dias de regime me esperam...

sábado, 2 de julho de 2011

crunch crunch, gasp gasp, coff coff

No início, era o grão. Amarelo, lisinho, brilhante. Aí, aconteceu o inevitável - a paixão deste pela gordura quente. E  o grão, que parecia seco, tímido, revela um interior úmido, e a contato desta ardente gordura, não aguenta sua pressão interna e explode revelando um interior rico, voluptuoso, barroco, um universo em expansão até então contido por uma fina membrana. Bastou a paixão quente para revelá-lo como pipoca.
Não gostar de pipoca é quase uma falha de caráter. É viciante, deliciosamente viciante - se bem feita. O processo de estourar milho é quase uma sinfonia. Começa suave, quase um adaggio, um estouro aqui, outro ali, iniciando um allegro.Aí, num crescendo, até alcançar um presto, um prestíssimo, culminando numa volta ao silêncio, o final do movimento, com um ou outro milho teimoso que ainda não quis revelar seu interior pipocando solitariamente, até o final. Aplausos!
No post anterior, falei de uma pipoca aromatizada com pimenta e curry, e coincidentemente logo após este post conheci dois empresários do ramo que me informaram haver vários tipos de milho para pipoca, com formatos exclusivos, coisas que desconhecia completamente. Bateu curiosidade... Aí a rede me serviu de base para o que já tinha visto vagamente - pipocas aromatizadas, numa variedade absolutamente inacreditável.

Nos site Popcorn Palace e no maravilhoso 479º os sabores variam de acordo com o tema. Temos, por exemplo: caramel nut, cookies and cream (com pedacinhos de biscoito oreo...devia ser passivel de penalidades  inventar uma coisa destas), cheese caramel, pecan praline, cheese caramel, versões salgadas com fleur de sal (vou fazer em casa ESTA NOITE!),cinnamon spice, pink himalayan salt & pepper (vou fazer esta também , com o sal que comprei no PÃO), ginger sesame caramel - ai, esta promete..., black truffle e outras tantas, cada uma mais instigante do que a outra.
Portanto, vou copiar a Julie do filme/livro Julia & Julie - como sou popcorn addict, vou experimentar todas as receitas que chegarem às minhas mãos desta variante gastronômica. Vou transformar minha cozinha num laboratório popcorniano.Vou criar novo métodos de estourar pipoca, vou ganhar montanhas de dinheiro com isto, vou incorporar Dr. Strangelove, vou dominar o mundo com a força explosiva da pipoca!
...Caindo na real, acho que vou apenas engordar mais um pouco...