food, art & spirits

food, art & spirits

sábado, 30 de abril de 2011

LULA NUNCA MAIS

Ristorante Santa Marta, Via Santa Marta, Milano. Sempre como bem neste restaurante, pequeno, e sem turistas. Exceto neste dia. Quero dizer, comi bem, mas...ao lado de uma montanha de turistas brasileiros barulhentos, alguns infelizmente conhecidos, falando a língua praticada pelo Totó - para quem não se lembra, uma novela brasileira recente onde todos falavam um arremedo de italiano e a tradução saía em seguida, sendo que, de cada 4 palavras, uma era "figura-te"...
Para ajudar concluí que naquela noite eu não estava muito afim de comer sozinho - ou pelo menos desacompanhado.Tem horas que é legal ficar só, tem horas que não. Tudo bem, encarei meu Risotto Nero com bravura - talvez influenciado pelo gótico cartão do restaurante.
Muitíssimo bem feito, tracei o imenso prato quase que inteiro, ao lado de uma garrafa de Gavi di Gavi, o suave do vinho branco em bom balanço com o sabor forte do prato. Risoto feito com tinta de lula tem um sabor meio - sei lá, de profundeza, alguma coisa abissal...Resolvi parar com o vinho, ao achar que estava ficando meio alto, encontrando sabores que não existem.
PS - lembrar de nunca mais pedir algo com tinta de lula. Os dentes e os lábios ficam enegrecidos, e as pessoas te olham com uma cara de "coitado, sozinho e esquisito. Também, com aqueles dentes pretos..."

domingo, 17 de abril de 2011

God Give Me Strength



Armani Caffe, Milano. Ao meu lado, uma periguete profissional de micro-shorts jeans, meias rendadas e botas de saltos altíssimos me lança olhares de taxímetro. Incauta...Pelo fato de estar jantando solo, ela deve ter deduzido que vim aqui para traçar outro tipo de iguaria. No, grazzie. Vim apenas para matar a fome, a caminho do hotel.
A iluminação é bastante avermelhada, quente, e a música suave é ótima, ligeiramente orientalizada com uma pegada bossa nova.
Espero´que a comida não seja "fusion" como a trilha sonora...Peço uma água sem gás e uma taça de excelente pinot noir, enquanto olho o cardápio. Estou tentando perder alguns relevos em minha silhueta, até agora sem sucesso. E a cesta de grissini e pães à minha frente não ajuda em nada. Digo minha escolha à atendente, uma Costoletta di Vitello Alla Milanesa com Pomodorini I Rucola, no meu melhor italiano, intensificado pelos dois dias nesta cidade. A loirinha aguada me responde que "é frito"...Questiono se existe este prato feito de outra forma, mas a americaninha fazendo estágio na cidade, e na condição de garçonete, não assimila minha ironia. Recusei uma entrada que prometia, um flã de alho poró, pois vi Panna Cotta na lista de sobremesas, e afinal estou de regime - ou sobremesa, ou entrada.
Bem, a carne está muito boa, já pomodorini é quase um exagero, vieram dois tomatinhos cortados pela metade que quase não configuram o plural citado na receita. Como o vinho acabou, tenho que implorar para a Jenniffer (deve se chamar assim) que me traga outra taça. Ela sorri cada vez que insisto, mas não conhece a fúria de um homem jantando sozinho e quase engasgado com as lascas de sal marinho não moídos que salpicaram no prato, desequilibrando um pouco o conjunto - tinha partes sem sal e outras salgadíssimas.

Enquanto espero a sobremesa, arriva um ragazzo molto bello, alto, magro (raiva) e cabeludo (raiva 2) para suprir a saída da perigueti. Ele está com uma calça tão baixa que mostra metade de seu derrière descoberto - ou seja, taxímetro a vista again. Chegou sozinho, tipo " não sei de onde veio, mas está claro onde quer chegar". Clara e seguramente sonda o ambiente antes de sentar e sua atenção recai sobre mim. Este, ao contrário da outra profissional, tem um senso de colocação do produto no mercado mais adequado, se é que você me entende. Traço a sobremesa,

que estava ligeiramente torta mas muito saborosa, e caio fora antes que a conta aumente. Não a do restaurante, mas a dos "serviços paralelos", por assim dizer. Total da conta - ¢54. Por enquanto, está barato. So, God Give me Strength. Fui.

domingo, 10 de abril de 2011

Everything Must Change

Everything must change.
Porque tive uma noite tensa . Tensa, não - vamos dar o peso real das palavras, tive uma noite assustadora, e tentei controlar-me o dia inteiro para não dar bandeira de que estava confuso, atordoado, atropelado por um fato que eu não esperava.
Porque um maluco, infeliz resolveu através de um ato insano deixar outras pessoas mais infelizes do que ele, ceifando a vida de crianças que não mereciam sofrer isto - mesmo para as que sobreviveram, que seguramente ficarão com marcas indeléveis em suas lembranças, e nós, infelizmente, não nos lembraremos delas no futuro.
Porque as pessoas procuram uma saída mais fácil para elas, esquecendo que poucas, pouquíssimas certezas são imutáveis. Porque a vida caminha independente de nossas ações, como os círculos provocados por uma pedra atirada na superfície de um lago - sempre sabemos que a queda da pedra provocará os círculos, mas nunca sabemos quantos, de qual tamanho e intensidade.
Porque infelizmente a justiça divina é um conceito de muitas explicações e discutíveis acertos.
E finalmente porque aquilo que os homens de fato querem não é o conhecimento, e sim, a certeza.

sábado, 2 de abril de 2011

POGO e PAIXÃO

Receber bem é uma arte dominada por poucos. Lembro-me de ter sido convidado para um almoço certa vez, aonde seria servida uma “famosa” feijoada. Ficou famosa mesmo – pela falta. Foi a primeira vez que vi alguém fazer feijoada para 4 pessoas achando que ia servir 12. Aliás, foi a primeira vez que vi alguém CONSEGUIR fazer tão pouca feijoada, um prato onde vai  tanta coisa que é impossível fazer pouco – pois esta anfitriã conseguiu. Não sei se era falta de prática ou ...prefiro não comentar.
Mas voltando ao assunto – receber é um conjunto de ações perpetradas e pensadas com precisão e carinho. E ontem aconteceu isto, a perfeição do momento – um jantar na casa do querido amigo Fábio. Ele e seu companheiro Fabiano receberam um grupo de 7 pessoas(Eu, Eduardo, Fernando, Fabio e Fabiano, Felipe e Luciano) para jantar em seu lindo apartamento cumprindo um convite há muito postergado por ambas as partes. Flores na casa perfumada, um excelente Lambrusco gelado repousando no balde, potinhos de castanhas, pistaches e outras coisinhas deliciosas, som na medida certa e a descontração de todos, tudo denotando carinho do anfitrião para com os convidados – precisa mais?
Sim, precisa. A comida, que foi feita por Felipe, seu irmão, estava simples – e deliciosa. Começamos com uma salada nas cores da bandeira italiana
composta de folhas, pequenos tomates e uma burratta impecável, com molho básico denotando conhecimento da mistura dos elementos. Prato principal – uma massa recheada de abóbora (que adoro!) com azeite de trufas , pinhole e lascas de grana padano. Comida feita na hora


(como demonstram as fotos acima), o cheiro se espalhando da cozinha aberta para a sala aguçando os sentidos e  o papo rolando solto à mesa, em noite que promete ser repetida, visto a sintonia das pessoas (outro quesito importante na hora de organizar um jantar ou festa). Terminou com um sorvete com calda e biscoito,
“montado” pelo dono da casa, que, se não tem os dotes culinários do irmão, esbanja em simpatia e atenção para suprir esta deficiência. Cada um escolheu sem tipo de café para terminar a noite (o meu era fooooorte, o que foi ótimo para fazer com que eu conseguisse chegar ileso em casa apesar da alta dosagem etílica), e voltamos para casa recheados de boa comida, carinho e atenção.
Ah, e o Pogo do título deste post? Um simpático bulldog, educado e extremamente afável apesar de sua aparência um tantinho agressiva, que passeou entre os convidados com muita fleugma e charme, mas escolheu Eduardo para demonstrar sua paixão, literalmente – apesar dos protestos dos donos, coroando esta noite com o elemento que faltava:  a paixão, irrefreável, incontrolável e explícita.
(Pogo deprimido pela paixão não correspondida...)
E, em homenagem ao autor da cena mais romântica da noite...