food, art & spirits

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sábado, 22 de setembro de 2012

moderno - uma praga?



Eu não podia de deixar de colocar a colher em panela alheia...leio esta semana que Michel Teló ganhou um prêmio de música (Prêmio Mais Mais, o que quer que seja isto). Em seguida, vejo a atuação constrangedora de todos no VMB 2012, com destaque - em prêmios - para Gaby Amarantos. Não, eu me recuso a compactuar com isto. Não vou falar que gosto do Teló ou da Amarantos apenas para parecer moderno e não soar como careta e reacionário - ao contrário. Acho a música de quinta categoria, as letras (letras?) infames, a estética vagabunda e copiada, não tenho paciência com isto.
Lembrei-me de uma grande amiga, culta até a última raiz de seus cabelos eternamente pintados, que, frente a uma instalação de incensado artista brasileiro - que consistia em fios de lã fazendo pendurados no teto da galeria, desenhando uma parábola - saiu-se com a seguinte pérola : "vamos embora daqui o mais rápido possível. Não gosto de ser taxada de antiga ou burra apenas por criticar um trabalho ruim e pretensamente moderno."
E é isto. Em nome da modernidade, tenho visto muita coisa ruim na MPB. Aquela insuportável da Joelma com seus trinados ridículos, uma grande gama de rappers brasileiros copiando descaradamente o pior do rap/hip hop norte-americano, uma cantora que se denominé "a Beyoncé do Pará" como se isto fosse alguma coisa boa, um cantorzinho insuportável como Luan Santana, bobagens como a grande maioria das coisas exibidas nos prêmios supra-citados. Não são bons cantores, não são originais, e espero estar certo, mas serão página virada na história em breve. No máximo, serão lembrados como coisa "exótica ou kitsch", mas nem isso mereciam. Querem parecer modernos? Sejam originais, mesmo regravando algo ou revisitando um clássico - como fez Kevin Johansen ao transformar a música de David Bowie em outro produto, diferente do original, mas de qualidade.
Isto me veio à cabeça depois de ver por duas vezes um chef que deve ter tirado terceiro lugar em alguma competição -o que deve ter  lhe valido o sobrenome - refazer em um programa horroroso alguns pratos clássicos da culinária popular, sob a estética moderninha. E conseguiu transformar o pato no tucupi - um dos pratos mais marcantes da culinária brasileira - em uma coisa cafona, com um milhão de informações no mesmo prato, com uma bula complexa e de execução pretensamente contemporânea. E todos, com medo de dizer que o o rei está nu, tecem loas e interjeições de espanto, na qualidade de arautos do modernismo gastronômico.
Ser moderno é mais do que isto. É ser ousado com qualidade, perceber a síntese do produto e expô-la, ser radical, irreverente e ousado - mas ser original antes de tudo. E não tentar ser moderno para sê-lo, pois isto é apenas patético. E pretensioso.

sábado, 15 de setembro de 2012

a gafe ou o trauma

Ocorrido há muito tempo, eu e Eduardo fomos vender um quadro importante para um grande colecionador carioca. Este resolveu nos oferecer um jantar em seu belíssimo apartamento à beira-mar, com toda a pompa e circunstância - drinks na biblioteca, mesa bem posta, primeiro prato, segundo prato, e eis que de repente eu escuto ao longe um barulho insistente de liquidificador. Gelei. Pensei comigo mesmo - "não é possível que  ele ofereça um creme de abacate batido, que odeio!, depois desta refeição impecável...não, estou pirando, relaxa e aproveita a noite."
A discussão/negociação sobre o preço do quadro rolava difícil quando chega à mesa o garçom com um belíssimo bowl Baccarat contendo uma coisa verdeamarelada, e eu gelei#2. Meu pior pesadelo tornara-se realidade à minha frente : nunca suportei o gosto do abacate batido doce, desde criança. Em suas versões salgadas (salada, molho, mousse), adoro, mas como doce, no way. Eu suava frio frente ao fato de que não teria coragem de recusar, para não atrapalhar o negócio ainda não realizado. Aceitei estoicamente a porção que me foi oferecida, regada com um pouco de Creme de Cassis para arrematar, frente ao olhar espantado de Eduardo, que sabia desta minha aversão. Fiz cara de "o que posso fazer? temos contas a pagar, não?" e encarei o desafio em largas e resolutas colheradas. No final da sobremesa, o anfitrião pergunta - "gostou do creme? é batido com sorvete, limão, mais alguma coisa - a essa altura eu já não estava ouvindo direito...- e cassis", no que respondi que sim, claro, tinha adorado. Péssima resposta: fui obrigado a repetir mais um pouquinho, a troco da gentileza desmedida e irrefutável do dono da casa. Trauma mesmo.
Lembrei disto ao oferecer um jantar para um casal recentemente. Fiz tudo direitinho, com um erro crasso - um amuse-bouche que era uma sopa de milhos assados com endro, e de entrada uma polenta com ragu de cogumelos - ou seja, milho + milho. O segundo prato era um brasatto impecável, e de sobremesa pudim de capuccino com crocante de caramelo, ambos deliciosos - mas dois pratos de milho era quase uma degustação, apesar dos sabores distintos e da quase perfeição dos dois pratos.
A noite correu solta, bom vinho, ótimo papo, passam-se os dias e descubro pelo meu convidado, muito tempo depois, que ele gostava de quase tudo, exceto ...milho. Sim, impingi ao meu amigo o mesmo suplício que tinha sofrido muito tempo antes, só que em dose dupla. Fora a gafe de servir dois pratos com o mesmo ingrediente básico, ainda não cumpri a premissa primordial de perguntar aos convidados se eles não comiam alguma coisa. Imagino o terror de meu convidado ao ver o primeiro prato, seguido do segundo - o suor frio contido, o enjôo sufocado, e ao mesmo tempo aceitar resignadamente a falta de opção. 
Bem, eu fechei a venda do quadro no primeiro caso, e acertamos um provável negócio no segundo. Moral da história : sempre se consegue engolir sapos - ou abacate, ou milho. Depende da proposta...
Sopa de Milho Assado

250 gramas de milho verde debulhado
3 colheres de sopa de azeite
1 alho poró em fatias (apenas a parte clara)
1/2 de xícara de creme de leite fresco
3/4 de xícara de caldo de legumes
pimenta do reino branca
1 punhado grande de endro (dill)
sal a gosto

Asse o milho com um fio de azeite no forno em assadeira coberta com papel alumínio por 25 minutos. Soltará um pouco de líquido, que será aproveitado.
Refogue o alho poró no azeite, junte o milho com seu caldo, o caldo de legumes, reduza por 4 minutos, adicione o creme de leite e a pimenta. Apague o fogo, junte o endro, corrija o sal e bata no liquidificador. Passe por uma peneira fina, e sirva em xícaras ou tacinhas com um fio de azeite aromatizado com pimenta. 


sábado, 8 de setembro de 2012

de grão em grão

Adoro grãos. Arroz, grão de bico, lentilha, ervilha, feijão, favas - coloque qualquer grão nesta lista, e eu traço. Em primeiro, eles me lembram tempos passados, quando comprava grãos a granel armazenados em imensos sacos de estopa nas quitandas e empórios de Santos, onde morei quando criança. Gostava da sensação de pegar os grãos de diversas cores do feijão, da sensação seca da ervilha e da qualidade escorregadia do arroz agulhinha, servidos em  pás cônicas de metal brilhante. E em segundo eu nunca associei especificamente esta predileção por suas qualidades benéficas em relação à saúde e ao bom funcionamento do organismo, sempre fui mais pelo gosto mesmo. Mas hoje  descobri as virtudes do feijão preto (pesquisando na rede, apenas para contrapor os argumentos de um detrator que dizia que feijão engorda muito - e eu não podia deixar passar isto em branco...), e por consequência, fui aumentando a lista da pesquisa, que deu no seguinte:
- feijão preto - útil para pessoas com o metabolismo da glicose irregular (diabetes e hipoglicemia), diminui o risco de ataque cardíaco pela presença de ácido fólico e magnésio, fora as fibras, e é ótimo antioxidante.
- ervilha - ótima fonte de vitamina K, portanto fortalece os ossos e também favorece a função cardiovascular.
- grão de bico - excelente para controlar o colesterol, e é um ótimo substituto para a proteína animal - é ótima fonte de energia.
- milho - grande apoio para a saúde pulmonar, em virtude da presença do caroteno. E é bastante benéfico para a memória, em virtude da Tiamina - além de apoio à produção de energia, mesmo sob stress, em virtude da presença de ácido pantoténico.
- feijão roxinho ou mulatinho - uma fonte de fibras cinco estrelas. Ajuda na memória (sim, Tiamina) e ainda tem Ferro. 
- aveia - diminui o colesterol e melhora significativamente a resposta do sistema imunológico às infecções bacterianas. 
- cevada - proteção contra o câncer de mama e colabora na conservação dos tecidos do corpo graças ao fósforo.
- arroz - claro, o integral possui muito mais nutrientes, minerais e menos carboidratos que o arroz branco. E - surpresa! ajuda a diminuir o apetite e favorece a perda de peso.
- lentilha - tem grande densidade nutricional e melhora a função digestiva e a cardiovascular, além de ser fonte considerável de ferro.
E por aí vai. Claro, uma feijoada com pé de porco, carne seca, toucinho, gorduras animais de toda ordem - um dos pratos mais "macunaímicos" que conheço - pode sobrepujar os efeitos benéficos do grão, bem como um risotto com muita manteiga também - e a cevada sob sua forma líquida não manifesta as mesmas benesses que a sólida, se é que você me entende. Eu não sou adepto do feijão diário com carnes - faço como faziam minha avó e minha mãe, temperado com alho e cebola refogados em azeite, sal, um tico de pimenta e uma folha de louro, simples, delicioso. Geralmente cozinho uma grande porção, divido sem tempero e depois vou dando uso ao produto - uma sopa, um tutu, ou feijão pura e simples. E é tão bom quando você gosta de uma coisa e ela oferece benefícios à sua saúde, não é? Torço todo dia para que algum cientista descubra as vantagens de uma dose diária de Dry Martini, que alguém abalizado reconheça que pão na chapa com manteiga faz bem para a memória, que quindim é ótimo anticoagulante, que batatinha frita não é calórica e que qualquer coisa a milanesa ou empanada regula os níveis de colesterol em excepcionais índices...

FRANGO COM LENTILHAS
2 coxas e sobrecoxas de frango desossadas
suco de meio limão
1 colher de mostarda dijon
lemon pepper a gosto
2 xícaras de lentilha de Puy cozidas com uma folha de louro
1 cebola grande
2 dentes de alho
2 colheres de azeite de oliva virgem
sal e pimenta a gosto

Tempere o frango com o limão, a mostarda e o lemon pepper. Reserve na geladeira por 1 hora, para pegar gosto.
Asse no forno a 180 graus por aproximadamente 30 minutos em um recipiente tampado com papel alumínio, junto com metade da cebola cortada em duas partes. Após este tempo, descubra, regue com o caldo obtido do assado e doure no forno por 8 minutos a 250 graus.
Refogue a meia cebola restante cortada em tiras no azeite até que fiquem ligeiramente douradas. Adicione o alho muito bem picado, acrescente a lentilha e tempere com sal e pimenta a gosto.
Sirva o frango sobre a lentilha, colocando a cebola assada por cima, finalizando com um fio de azeite virgem. Claro, receita para duas pessoas. Magras.