food, art & spirits

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sexta-feira, 29 de novembro de 2013

miojo de luxe

Minha falta de preconceitos no campo gastronômico já me proporcionou
1)excesso de peso
2)perda de roupas
3)gastrite
4)y otras cositas más.
Quando viajava pela empresa em que trabalhei no passado, sempre sozinho, me aventurava por pratos e iguarias que desconhecia por completo - e se me dei mal em algumas vezes, na maior parte fui muito bem agraciado com sabores e temperos inesquecíveis. E tento trazer esta falta de preconceitos para todos os campos de minha vida, pois acredito piamente em conhecer o assunto ou objeto ou caso em questão antes de emitir um parecer desconexo ou - preconceituoso. E de repente me vi olhando com maus olhos um livro que tratava o Miojo (sim, aquele macarrão instantâneo típico de casa de estudante ou de quem vai morar fora e não sabe nem fritar ovo) como matéria prima para pratos mais sofisticados. 


Apesar dos chefes envolvidos neste projeto (de caráter comercial mas também comemorativo), sob o meu ponto de vista era como compor uma parede cheia de bons quadros com um Romero Britto no meio - a falta de qualidade (absoluta no caso do artista citado) de um dos elementos poderia desandar todo o conjunto, fazendo com que ingredientes bons fossem desperdiçados. Mas eu lembrei de uma salada deliciosa que a Rosa, do Z Deli serve em seu delicioso restaurante, que contém a massa inventada pelo Sr. Momofuku Ando no princípio do Século XX, e resolvi me arriscar. Estava sozinho em casa, querendo comer algo saboroso e leve, e fui inventando. E não é que deu MUITO certo? Rápido, com elementos picantes, ácidos, um pouco de "crocância", fui misturando tudo acompanhado de um vinho rosé bastante honesto, do qual não me lembro. A salada definitivamente entrou no cardápio de casa, e já penso em variantes com gravlax, ovas de salmão, pepino com iogurte e endro...Portanto, Miojo dá caldo - em todos os sentidos. 
Observação - este absolutamente não é um post pago ou publicitário, adoraria que o fosse!


Salada Momofuku
(eu inventei a salada, coloco o nome que quiser...)
1/4 de pacote de Miojo (individual mesmo)
1/2 pimenta dedo de moça
um punhado pequeno de uvas passas brancas sem caroço
1/2 xícara de acelga picada
1/2 xícara de repolho roxo picado 
1/3 pimentão amarelo em tirinhas
6 azeitonas verdes sem caroço
2 colheres de amêndoas em lascas
raspas de meio limão
azeite a gosto
sal a gosto

Quebre com as mãos o Miojo em pedaços. Reserve.Ferva uma xícara de água, coloque uma colher de sopa de sal, coloque o Miojo, cozinhe por três minutos, escorra e reserve. Misture os vegetais com a uva passa, as azeitonas picadas, as amêndoas e a pimenta dedo-de-moça em tirinhas. Verifique se a massa já está fria - se necessário, jogue-a rapidamente num bowl com gelo para interromper seu cozimento excessivo. Incorpore o macarrão à mistura, tempere com o azeite, as raspas de limão e o sal.


sexta-feira, 22 de novembro de 2013

a polenta de calder


Calder é uma de minhas maiores paixões. Faria coisas obscenas para ter uma obra dele, mas infelizmente a menos que eu ganhe sozinho na mega-sena, as chances disto acontecer são mais remotas do que os réus do Mensalão sofrerem as penas que nós, mortais, sofreríamos. Mas voltando ao alto nível - sob meu ponto de vista,Alexander Calder é um dos artistas mais originais e completos da arte do século passado, e seu legado ainda vai perdurar ao longo de toda história (ao contrário de minha opinião sobre Damien Hirst - a.k.a. "tubarão cortado ao meio decompondo-se em tanque de formol" e Beatriz Milhazes - mas isto será um outro post). 
Tenho vários livros sobre este incomensurável artista, mas um me é particularmente especial : Simplicity of Means, Calder and The Devised Object. Mostra os objetos para uso cotidiano que Calder fez para sua casa - colheres, candeeiros, peneiras - fazendo uso de arames, latas, tampinhas de metal e outros materiais para lá de prosaicos. Em alguns momentos, lembram o utilitário feito por populações carentes do interior brasileiro - peças igualmente dotadas de sensibilidade e genialidade - mas em sua maioria demonstram uma maestria no olhar que traduzem de imediato o repertório do autor. 



Este livro fica eternamente exposto ao lado de minha poltrona de leitura, para me lembrar que a criatividade e a genialidade não dependem exclusivamente de recursos caros ou sofisticados. Sim, tartufo é ótimo e é caríssimo, mas não é fundamental. Com recursos limitados, pode-se fazer um prato ótimo, reconfortante e bastante sofisticado, como a "minha" polenta. Que eu garanto - não dá muito trabalho (exceto ficar suando 25 minutos mexendo uma panela borbulhante) e é de comer rezando. Claro que eu preferia servi-la num bowl ou numa colher feita ou desenhada por Alexander Calder, mas...não peçamos a lua, se já temos as estrelas, não é?

Polenta da minha casa
1/2 litro de caldo de frango
1/2 litro de água
250 gramas de farinha de milho para polenta ou fubá (eu uso Moretti, ótima)
2 colheres de manteiga
2 colheres de azeite virgem
pimenta do reino moída
100 gramas de parmesão ralado
Aqueça a água até ferver. Abaixe o fogo. Lentamente, vá derrubando a farinha de milho, mexendo constantemente. Vai demorar uns 15 minutos até ela incorporar - de início parece que ela está "separada" do caldo, mas com o calor e com o temo ela vai engrossando. Quando começar a engrossar - nesta hora ela explode em boorbulhas como pequenos vulcões - adoro esta parte - abaixe o fogo para mínimo e continue mexendo sempre no mesmo sentido. Acrescente o azeite, a manteiga o parmesão e a pimenta do reino. Corrija o sal se necessário. Neste dia, eu servi com um ovo quente por cima e umas lasquinhas de grana-padano. E as pessoas adoraram. Estou pensando em servir no futuro com ora-pro-nobis, a delícia mineira, mas já servi com agrião precoce e ficou WOW!

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

o inesperado

Uma das obras que mais admiro de Matisse, um artista pelo qual sou apaixonado (junto aos estudos e recortes dos vitrais que estão na National Gallery) chama-se The Swimming Pool. 
Uma colagem em papel kraft, papel recortado e gouache, que ele fez para a própria casa. Me imagino falando com ele, dizendo ser esta a minha obra preferida deste imenso artista, e ele retrucando - "pintei quadros magníficos, transformei o cenário da pintura, retratei meu atelier com detalhes e você gosta de um quadro que só tem uma cor e é de papel recortado?" 
Senti isto na pele outro dia, em casa. A pessoa que vos escreve se esforça, capricha, coloca toda energia para fazer um prato principal - um pernil quase pterodáctilo de tão grande, que ficou doze horas marinando, sete horas assando em forno médio, continuamente regado, provocando queimaduras na mão direita, suou frente ao forno durante horas, e é elogiada de forma quase burocrática. Mas neste ínterim decidiu de última hora fazer um prato vegetariano para um dos convidados, e as pessoas entoam um "OOOHHHH!" de maravilhados. Fiz um quibe de abóbora, prosaico, mas acho que foi feito com cuidado especial, em virtude de ser oferecido a um grande amigo, outro imenso artista plástico e de paladar bastante apurado. Do pernil pré-histórico ainda resta um pacote dele desfiado, no freezer, aguardando nova transformação (vi uma torta de pernil hoje no Instagram, que me animou bastante - e amanhã é feriado, será que encaro isto ou vou passar o dia fazendo nada à beira da piscina?).Mas do quibe - sobrou um tiquinho que comi no dia seguinte. E estava realmente...Wow!Uma receita prática, e deliciosa. Gosto não se discute mesmo...
Quibe de abóbora
800 gramas de abóbora
400 gramas de trigo para quibe
1 cebola cortada em cubinhos
1 alho poró cortado em fatias finas
um maço de hortelã
1 xícara de nozes picadas
1/2 xícara de amêndoas em lâminas
400 gramas de queijo de cabra
azeite
sal
pimenta do reino
Faça uma infusão com 5 / 6 galhos de hortelã e um litro de água, espere esfriar e coloque o trigo para demolhar. Aguarde meia hora, coa e esprema até sair toda a água.
Asse a abóbora picada em pedaços médios embalada em papel alumínio, a 220° por 40 minutos. Tire da embalagem, amasse grosseiramente. Refogue a cebola em azeite até ficar transparente, adicione a abóbora, espere esfriar um pouco. Incorpore a abóbora amassada com o trigo já espremido, acrescente uma xícara de hortelã picada, sal e pimenta do reino. Reserve. Refogue o alho poró em azeite, adicione as amêndoas, reserve. Misture o queijo grosseiramente com as nozes, reserve.
Em uma forma refratária untada com azeite, coloque metade da mistura do quibe, cubra com o queijo com nozes, espalhe o alho poró com as amêndoas, e complete com o resto do quibe. Corte losangos ou retângulos sobre a superfície, passe um fio de azeite e leve ao forno a 240° por 20 minutos. 

segunda-feira, 4 de novembro de 2013

ícaro e o bambu

Pensava no mito de Ícaro e Dédalo enquanto observava em meu jardim um bambu que nascera espontaneamente e crescia de forma absolutamente vertiginosa e rápida. Dédalo e seu filho Ícaro foram encarcerados no labirinto do Minotauro; para sua fuga, Dédalo construiu asas feitas de cera do mel de abelhas e penas de gaivotas, alertando o filho de que caso se dirigisse muito para o alto, o calor do sol poderia derreter suas asas - e se se dirigisse ao mar, suas asas poderiam ficar mais pesadas. No entanto, Ícaro não ouviu os conselhos do pai e, tomado pelo desejo de voar em direção ao sol, acabou despencando do azul celeste em direção ao mar Egeu. Uma parábola sobre como a sede do conhecimento pode nos levar a caminhos - ou finais, no caso - inesperados. Serve também para ilustrar o eterno desejo da juventude de ignorar os conselhos familiares e trilhar sua própria história. Ou para mostrar que nossos desejos têm limites - e que, quando os ultrapassamos, estamos sujeitos a leis maiores. 
Mas voltando ao jardim de casa - um brotinho nascera ao lado do bambu que tenho ao lado esquerdo da porta do terraço. E - juro - em pouco mais de 10 dias, alcançava aproximadamente 2,5 metros. Enquanto escrevo isto, ele já está próximo aos 4 metros de altura, 15 dias depois de ter sido oficialmente notado, à época com 5?10 centímetros. Questionando um amigo paisagista, descobri que este é um "filhote" do bambu, e que não nasceria com o mesmo desenho do outro, torto e espalhado, mas provavelmente mais retilíneo e verticalizado. E que, caso eu não o cortasse bem cedo, provavelmente causaria a morte de seu "pai" - e isto era visível, pois enquanto ele cresce seu par parece definhar, com o tronco menos verde e perdendo as folhas, a despeito de meus esforços para mantê-lo vivo e saudável. Este bambu filhote procura os céus desesperadamente como Ícaro em sua fuga - esta era a ligação que eu fazia quando no jardim. 


O vinho branco estava perfeito - um Sauvignon Blanc chileno, o sol estava começando a dar sinais de ir embora prematuramente às quatro da tarde deste horário de verão, e eu a fazer relações entre o bambu patricida, Dédalo, Ícaro e todas as suas interpretações. 
Não cheguei a nenhuma conclusão, mas desci para a cozinha e fiz uma salada grega. Fácil, mediterrânea, fresca e rápida, ainda deu para ver o dia acabar, junto a mitos e um bambu que não para de crescer. 


Salada grega
1 pepino japonês com casca
2 tomates não muito maduros
1/4 de pimentão amarelo
1/4 de pimentão vermelho
1 cebola roda em fatias
10 azeitonas pretas
4 fatias de queijo feta
oregano fresco
sal / pimenta do reino
azeite 
suco de meio limão

misture o limão com azeite e oregano fresco. reserve. 
corte os tomates sem sementes, o pepino e os pimentões em pedaços parecidos. misture, adicione as cebolas, as azeitonas sem caroço (por favor...não vai ficar bem alguém quebrando um dente depois desta história toda de Grécia, mitologia, botânica, psicologia e por aí vai...) o queijo e a mistura de azeite. Mexa o suficiente para incorporar os elementos, coloque a pimenta do reino e sal a gosto.