food, art & spirits

food, art & spirits

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

breakfast at morumbi

Em primeiro lugar, desculpem o trocadilho infame do título deste post. Detesto trocadilhos em geral, mas de vez em quando a gente escorrega...Bem, preciso confessar que acordo com uma fome animal, ancestral. Talvez em virtude deste regime que não me permite ataques noturnos à geladeira, e também pelo fato de que como sou muito controlado durante o dia (em quase todos os sentidos, não apenas no gastronômico), à noite eu sou um animal na cama. Dou pulos involuntários, me mexo feito siri na lata, estapeio o abajur, derrubo o copo d´água na mesinha de cabeceira, portanto, depois de tanto exercício, acordar com fome é o mínimo que se permite. E acordo precisando de energia imediata - nada tão radical quanto ao Calvin acima. Mas sem café, para começar, no chances. Meu cérebro demora um pouco para pegar - e a culpa não é da idade, caso alguém queira fazer gracinhas.
E neste feriado de sete de setembro, decidi aproveitar o dia lindo par fazer algumas coisinhas mais substanciosas para aquilo o que os portugueses chamam de pequeno almoço, os italianos prima colazzione, os franceses petit dejeneur. Ou seja - calorias. Percorri alguns blogs para me ajudar nesta empreitada, e enquanto produzia algumas coisas, comecei com o básico - um papaia maduro com limão e flocos de milho integrais sem açúcar. Como apresentação ajuda, não? Um mamãozinho básico com Nesfit, e olha que bonitinho... E caso alguém estranhe, minha cozinha é preta, por isto as fotos ficam ligeiramente "dark"...
Aí entram os amigos blogueiros. Tinha um restinho de sementes de papoula, proibidas agora (quem proibiu? onde achar outras? vou ser preso por usa-las?), uns limões sicilianos perfumados na fruteira, e como eu estou me aventurando no terreno dos doces, bolos & afins, fui pesquisar. Por uma questão de praticidade, fui logo num blog que adoro, o Gourmandise, do casal Marcel e Nina. Um blog elegante, sofisticado sem ser pretensioso, e e consegui uma receita de 2007, perfeita. Enquanto preparava o bolo, que assaria por 40 minutos, lembrei-me das panquecas que comia no Plaza Hotel New York. Eram fofas, servidas com morangos e mel, deliciosas. 
E eu me lembrei que tinha visto uma receita diferente da minha no Cozinha Coletiva , do Richie, que se for magro, é por maldade divina. O rapaz cozinha que é uma beleza, e foi de lá que peguei a receita da panqueca (ou pancake, se preferir) acima. Um pouquinho de geléia de figo, um pouquinho de mel de laranjeira e morangos maduros completaram o que considero a receita definitiva desta coisinhabonitinhadopai...Aliás, caiu-me a ficha de que a palavra pancake significa "bolo(cake) de panela ou frigideira(pan)", o que justifica a altura da que vocês estão vendo na foto.
O Bolo ficou como escrevi - com B Maiúsculo. Fofo, saboroso, podia ter colocado um pouquinho a mais de limão do que a receita (que você pode ver AQUI) pede, mas é uma questão de gosto. As panquecas ficaram impecáveis, macias e a textura dada pelo fundo da frigideira deram uma ligeira "cara" de waffle à receita, mas nesta eu não mudaria nada, a não ser incrementa-la das próximas vezes, com canela, raspas de laranja ou limão, especiarias, fazer com farinha integral, etc.etc.etc. A receita do Richie (que você encontra AQUI ) dá para duas pessoas - normais. Ou uma, se for o meu caso. Por sorte, aumentei em 50% as medidas, para que tanto Eduardo quanto para Rosilda, minha fiel escudeira, fundamental para a manutenção da cozinha depois destes preparos todos, pudessem usufruir do mesmo. O bolo? Olha que simpático, repousando em guardanapo com tecido desenhado por Burle Marx.
Agradeço aos meus companheiros blogueiros estas receitas, prova inconteste de que a culinária é um ato de generosidade. Estou quase aceitando encomendas...

sábado, 3 de setembro de 2011

gosto amargo

Cheguei em casa entusiasmado. Tinha tido um dia produtivo,cercado de amigos, fez sol em São Paulo apesar do frio - proporcionando um dia de céu azul sem manchas, lindo. Cheguei em casa pronto para fazer um bolo de aipim que tinha visto no blog da NEIDE RIGO ( sim, citado no POST anterior), e me aventurei neste campo que ainda não domino, o dos doces e bolos. Cheguei em casa recebido por meus cachorros, em companhia de Eduardo, a casa ainda banhada pela luz do final da tarde, minhas coisas e meu espaço inundado de uma luz magnifica, suave, pacífica. Cheguei em casa e soube que um amigo, jovem, bonito, companheiro de um outro querido amigo foi morto, vitima de um crime covarde, estúpido, cruel. Que aconteceu à porta de sua casa, no meio de um sábado movimentado, como são todos os sábados de sol no Rio de Janeiro. À vista de todos, seu corpo inerte nas cruéis e oportunistas fotos dos sites, para dor daqueles que o conheciam.
Estou em casa e o cheiro do bolo inunda a cozinha, a sala, penetra nas narinas. Estou em casa e acabo de fazer um bolo que, por mais saboroso que esteja, por melhor que tenha sido a escolha dos ingredientes, por mais preciso que tenha sido seu preparo e cocção, infeliz,ente vai me lembrar um fato triste.
Rômulo C., in memoriam

domingo, 28 de agosto de 2011

Goniopsis Cruentata ou Gnossienne

Então eu descobri o aratu.
Um caranguejo especial, de carnes delicadas e extremamente saboroso.Aparentemente, pesca do aratu era uma atividade essencialmente feminina: as mulheres iam para o mangue pela manhã e cantavam canções tradicionais para atraírem os crustáceos para uma armadilha. Si non é vero, é bene trovato, como dizem os italianos. Mas voltando: o aratu me foi apresentado depois de anos freqüentando Recife, pela primeira vez ontem, sob a forma de uma opulenta fritada deste crustáceo de nome elegante, que me lembrou uma peça de Erick Satie (o que gerou o título do post). Eu já tinha comido agulhas fritas, uma empadinha de queijo-do-reino altamente calorica, uma de camarão, meio copo de caldinho, um casquinho de caranguejo
 e aí um chegou este prato, pedido por um amigo. Aviso aos que não me conhecem: não coloquem comida que eu não conheço perto de mim. Se não fui eu quem pediu, eu fico louco, quero pedir um pedaço, quero tocar com os dedos e toda sorte de atos vexatórios, mesmo se a pessoa em questão não for intima. Os que me conhecem já sabem disto, e me oferecem antes mesmo de provarem.
Bem, voltando: o aratu e muito, muito bom. Coloquei no Facebook que ia rever minha relação com os amigos pernambucanos, que ainda não haviam me apresentado esta iguaria. É que tenho uma predisposição para o novo, em termos gastronômicos, que já me causou problemas. Gástricos e financeiros...
Um dia antes, aqui em Recife, tinha comido um peixe com molho de camarões numa versão tão pretensiosa e malfeita, com molho branco, queijo e sei-lá-o-que-mais (achando que ia comer uma prosaica pescada com molho fresco de tomates, cebolas e camarões, como deveria ser), que fiquei matutando: o que leva uma pessoa a consumir variantes tão distantes de sua cultura, se estas variantes não são originais, autenticas e sequer bem-feitas?
Comprovei esta sensação hoje, ainda na capital pernambucana, quando fui convidado a tomar sorvete num local recém-aberto. Cheguei ansioso por sabores como cajá,
graviola, tapioca, mangaba, caju, pitanga. E vi na geladeira: sorvete de fruta do bosque(sim, no singular...), de creme russo( uma coisa rosa-acrilex...), de pistache (uma coisa verde-acrilex), de baunilha (uma coisa amarelo-limão-acrilex...), de cheese-cake...Notei que eram os mais pedidos. O que faz uma pessoa aceitar sabores que não conhece na integra, em detrimento de seus conhecimentos ancestrais? Não, não prego a xenofobia gastronômica, topo tudo neste segmento, lembram? Mas não consigo aceitar a desvalorização dos elementos típicos de uma cultura em prol de uma pseudo-internacionalização. Minha amiga Janete Costa, de quem sempre me lembro, mulher cultíssima, disse-me uma vez: "é mais fácil ser internacional se você tiver consciência de sua regionalidade e características desta." Aqui em Recife e mais fácil conseguir caipirinha de kiwi ou morango do que de caju, que adoro e considero muito mais sofisticada e saborosa.
Por isto que adoro a Neide Rigo, do COME-SE. Profunda conhecedora da culinária brasileira, defensora de uma valorização dos elementos de cada lugar, de seu aproveitamento absoluto, ela tem mais chances de se tornar internacionalmente conhecida do que quem copia valores externos para se sentir up-to-date.
O que o aratu não faz num homem...

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

dividir e multiplicar

Cheguei em casa meio tarde, cansado. Os cachorros me receberam efusivos - aliás, efusivos até demais, parece que eu fiquei dias fora, e não que atrasei-me apenas 40 minutos de meu horário normal. Creio que os cachorros não tem uma noção de tempo muito precisa, vou pesquisar a respeito. Mas, voltando. Já disse aqui que não acho ruim ficar sozinho, meu problema é que fico meio "ligado" quando estou sozinho em casa. Ouço o som no último volume, cozinho, arrumo armários, leio, arrumo armários (sim, de novo...), faço uma montanha de comidas ou de bases para estas - caldos, molhos, recheio de torta, etc.etc.etc...- tudo isto ante os olhares atônitos dos cachorros, principalmente de Leopoldo, que fica sentado entre a sala e a cozinha me olhando com uma cara de "pirou?"...
E tenho uma certa rotina para estes momentos. O primeiro - alguma coisa para beliscar, e algo para beber. Azeitonas ótimas e frescas e cebolinhas em conserva, mais uma (ou seriam três?) taça de suco de maracujá coado com vodka hipergelada e umas gotinhas de angostura.


 Tudo isto porque eu queria usar uma coqueteleira de vidro que comprei numa feirinha de antiguidades, e ainda não tinha usado. Som no alto, qualquer dia a vizinha reclama feio, mas pelo menos meu gosto musical é eclético, de alguma coisa ela vai gostar. Hoje eu andava de Elis Regina a Brad Mehldau, passando por McCoy Tyner e Everything But The Girl - ou seja, de quase tudo, um pouco.
Eu tinha vindo para casa pensando no arroz negro que tinha comido em Milão (visto AQUI), quando, coincidentemente, estava sozinho também. Imaginava em que bases eu conseguiria tingir o arroz da forma como este risotto consegue, deixando-o negro como carvão. E estava louco para uma comidinha reconfortante, visto não ter tido tempo de almoçar. Na geladeira ervilhas frescas, brócolis japonês novinho (prefiro o outro, grandão, mas este era o que tinha), alho-poró,cebolinha...Vou tentar fazer um risotto verde hoje. Acrescentei alguns bouquets de brócolis ao caldo de legumes que já tinha, reduzi um pouco e bati tudo no liquidificador. Coei 3 vezes - a última numa peneira bem fina, para obter um "caldinho verde".
Fiz o risotto como na receita abaixo, mas não consegui transformar meu arroz em verde, apenas "esverdeado".


Assim como também não consegui transformar minha noite em algo não solitário. Descobri que algumas coisas são melhores quando compartilhadas. Risotto, por exemplo. Lógico que o que sobrou eu guardei, para fazer um riso al salto, mas apesar da companhia interessada de Leopoldo (ele não é fotogênico?)

percebi que esta compulsão para o fazer é uma forma nada velada de não se sentir sozinho. Vou ter que criar uma nova dinâmica para minha vida, visto que agora moro um pouco mais longe e também que em média 15 dias do mês estarei sozinho. Pois, se não fizer algo, vou acabar engordando. Ou alguém aqui conhece outro maluco que faz risotto para uma pessoa só, tentando passar o tempo enquanto fala com os cachorros?

Risotto Verdinho
100 gramas de arroz arbóreo
600 ml de caldo de legumes
4 bouquets pequenos de brócolis
4 bouquets mais os talos dos brócolis
1 alho poró em fatias finas
1/3 de xícara de ervilhas frescas
1 dente de alho
1/2 xícara de cebolinha picada
2 colheres (sopa) de parmesão ralado grosso
1 colher (sopa) de manteiga gelada
1 colher (sopa) de azeite de oliva virgem
1 cálice pequeno de vinho do porto branco seco
Junte os talos e 4 bouquets de brócolis ao caldo, cozinhe-os bastante, bata no liquidificador e coe por 3 vezes em peneira muito fina. Reserve.
Refogue o alho poró e o alho no azeite. Misture o arroz, deixe incorporar o azeite ao arroz, derrame o porto branco, espere evaporar o alcool, coloque o caldo aos poucos, esperando quase secar para repor mais caldo. Após 10 minutos coloque os brócolis e a ervilha. Mexa durante 2 minutos, incorpore a manteiga e o parmesão ralado. Verifique e corrija o sal se necessário, acrescente a cebolinha, espere descansar 2 minutos e sirva.
Para mais de uma pessoa.

domingo, 14 de agosto de 2011

one for the road



One for my baby, one for the road...


Escutava Robbie Williams cantando isto no ultimo sábado a tarde, em casa. Relia "O Escaravelho de Ouro" de Poe, e lembrei da tequila que ganhei de minha amiga Karina D. em sua viagem ao México, esperando para ser aberta. Uma tapenade recém feita repousava dentro de um pote hermético,e o pão sueco em lâminas finas casava muito bem com estes parceiros. Cenário perfeito: uma poltrona confortável, bebida ótima e algo para mastigar enquanto lia este conto fantástico. Que me levou a outro conto do mesmo autor, e outro, e quatro tequilas depois, a concentração já não estava tão ...concentrada. Hora de comer algo, mas a cozinha me parece diferente hoje. Seriam os raios de sol neste sábado paulistano, ou os efeitos do aguardente que faziam tudo parecer mais lento, meio difuso...?
Encarei a geladeira, ela me encarou e disse, do alto de sua prepotência metálica : " E aí, está esperando o quê?"... Eu quase respondi para ela...
Uma eternidade se passou enquanto eu abria a geladeira e o freezer, esperando alguma idéia, algum estalo que contribuisse para dissolver minha falta de iniciativa e o inicio de um estranho torpor - fora a súbita vontade de deitar no sofá, deixando a geladeira com suas intimidades expostas.
Eis que de repente vejo um ligeiro brilho metálico, a ponta de uma cápsula que cobria um sauvignon blanc de excelente qualidade, deitada em berço frio, esperando que eu a retirasse deste repouso para dar-lhe corpo através da taça.
E o Cloud Bay, vinho do novo mundo, novamente não me decepcionou. Um bip ao longe me indicava: " falta algo, falta algo...". Era o alarme da geladeira de ultima geração me dizendo ACORDA HOMEM! Você não ia cozinhar, ou prefere uma inscrição on-line na AAA?
De repente, me vejo frente uma panela imensa com água e outra menor, também com água. Enquanto a panela maior ainda nem deu sinais de que está sobre a maior chama do fogão, a menor já está fervendo, e nesta despejo quatro lingüiças de lombo. Enquanto estas cozinham um pouco, apenas para que parte de sua gordura se esvaia e que eu possa tirar-lhes as peles, pico um alho-poró, dois dentes de alho, tomo mais uma taca de vinho e corto em fatias 4 shitakes grandes. Escorro as lingüiças, tiro as peles das mesmas, corto em pedaços e coloco em uma frigideira em fogo baixo, para que derretam um pouco mais de sua gordura.
Derramo azeite na frigideira sobre a lingüiça, tampo e aumento um pouco o fogo. Cadê o parmesão? Tiro um pedaço deste queijo forte, experimento-o e ele casa perfeitamente com mais uma taça do vinho. Coloco Robbie Williams novamente para tocar a música mais conhecida por Frank Sinatra e esqueço um pouco do tempo, até a água da panela grande manifestar sua fúria incandescente. Incorporo os alhos à lingüiça, e cadê o queijo de novo? Como ele foi parar na sala, sobre o meu livro? E onde foi que esconderam o ralador de queijo de casa? E porque esta panela está fervendo sem nada dentro?
Inspire. Espire. Tome uma taça de vinho, e lembre : você ia fazer " una pasta ubriaca " e quem está ubriaco é você, e não o macarrão...
Jogo o sal na panela cheia d´água, ele causa uma reação , levanta-se e diz "estou pronta, anda homem, cadê o spaghetti?"... Deito suavemente meio pacote de spaghetti integral na panela, coloco o shitake na outra, bebo mais um pouco de vinho e...CADÊ O QUEIJO DE NOVO?
Encontro-o com o ralador dentro do armário das panelas. Mistério...
Ralar rapidamente o queijo. Estancar o sangue da ponta do dedo que ralou. Catar um band-aid e não dar bandeira do que está acontecendo. Escorrer o macarrão, mas se lembrar de colocar o band-aid antes. No dedo, não na panela. Derramar uma taça de vinho branco na frigideira. Não, meia taça não pode, coloque uma taça inteira. Deixe evaporar um pouco do álcool na panela, o que está na sua cabeça não vai evaporar tão fácil. Misture a massa e dois punhados fartos do queijo assassino mutilador de dedos. Mexer rapidamente, e o que eu faço com esta salsinha que piquei tão cuidadosamente mesmo? Misturo com a pasta ainda na panela,

sirvo imediatamente, Du, vem comer porque comida quente não espera. Sinto muito, não tem vinho aberto, só um restinho, quase nada...quer coca-cola ou água?







Receita ( Mais ou Menos Sóbria ) de Spaghetti Ubriaco (que em italiano quer dizer alcoolizado, bêbado mesmo...)

250 gramas de spaghetti (usei o integral)
4 colheres de sopa de azeite de oliva virgem
1 alho poró (uso quase até as folhas, não uso apenas a parte branca)
2 dentes de alho
250 gramas de linguiça de lombo
4 shitakes grandes
1 garrafa de vinho branco seco (uma taça para a receita, o resto para o cozinheiro...)
1 xícara de parmesão ralado grosso
1 punhado de salsinha finamente picada
pimenta do reino moída na hora
sal a gosto
Escalde as linguiças e retire-lhe as peles. Enquanto cozinha o macarrão em abundante água fervendo com um pouco de sal, refogue as linguiças, acrescente o alho poró, o alho, o shitake, deite o vinho branco (apenas uma taça, lembre-se!), espere evaporar o álcool, misture a massa já cozida (que deve demorar 8 minutos se for integral, bem menos se não for), misture o parmesão e a salsinha, verifique o sal, moa a pimenta do reino e sirva. Hic!

domingo, 7 de agosto de 2011

NÃO É A MAMÃE!

...
- Wair, decidimos não sair. Vamos ficar aqui batendo papo, enquanto você faz alguma coisa p´ra gente comer.
- Sem chances, senhores. Cheguei de viagem ontem, e não deu tempo de fazer compras.
- E desde quando você não tem nada guardado no armário para uma ocasião destas? Eduardo sempre fala que você entra em depressão quando a geladeira está vazia...
- Em depressão está minha geladeira. Com um vazio interior...
- Tem vinho?
- Claro. Tenho algumas garrafas de Catena Zapata, ótimo Malbec.
- Então, metade do caminho está resolvido!
- Para com isto, criatura! Minha despensa está vazia, a geladeira idem, e ainda não cheguei no milagre da multiplicação dos peixes, pães e o que quer que eu tenha em casa.
- Olha aqui. Tem ovos na geladeira.
- Dois ovos! Nós somos oito - vocês se contentam com 1/4 de ovo cozido?
- Pronto - ovos e bacon. Dá para fazer uma pasta a carbonara...Já comi na sua casa, e lembro que era um dos melhores que já comi até hoje...
- Agradeço o elogio, mas não creio que seja sincero. Vocês estão querendo que eu providencie algo palatável, portanto até aquela minha ultracomentada tentativa infrutífera de copiar o souflèe do Marcel vai ser elogiada agora. Sem chances.
- Wair, tem praticamente um carbonara esperando por você aqui na geladeira, qual o ...
- Primeiro - o verdadeiro carbonara é feito com Pancetta, e não com Bacon. Segundo, com Pecorino, e não com Parmesão, o único queijo disponível neste recinto no momento. Terceiro - somente tenho papardelle integral, ótimo, mas que não vai dar certo com esta receita. Quarto -
- Já sei. Não precisa mais explicar, você está com má vontade mesmo. Um carbonara é tão fácil de fazer...
- Má vontade? Já expliquei que não dá para fazer o carbonara com o material disponível ?
- Como não? Tem ovos, queijo, bacon...
- Posso fazer uma omelete. Para dois. Portanto, até amanhã.
...
- Mas que cara é esta?
- Cara de quem está com vontade de comer um papardelle alla carbonara e o amigo cozinheiro está com frescura. Ok, tudo bom. Vamos beber o vinho, que promete, e sairemos daqui completamente bêbados, tudo porque o "chef" não quis modificar um pouquinho a receita.
- Vocês sempre foram chatos e insistentes assim, e eu nunca tinha percebido, ou receberam alguma entidade que se recusa a subir?
- Vai rolar comida?
- Abram o vinho, coloquem a mesa que eu me viro com o que tenho aqui.

Neste ponto da noite, eu vi que não podia mais contrariar os amigos que já tinham decidido ficar aqui por mais tempo, atualizando os assuntos, como disse um deles. Mas não dava para fazer o que me pediam, uma pasta à carbonara. Porém...a base deste prato inspirou uma variação muito boa. Enquanto o papardelle integral cozinhava em água abundante, piquei o bacon bem pequeno, derreti sua gordura na frigideira quente, adicionei quatro dentes de alho picados, três peperoncinni, um pouco de azeite virgem. Separadamente, misturei os dois ovos com uma xícara de creme de leite fresco, um pouquinho de pimenta do reino branca moída na hora e uma xícara de parmesão ralado.
Retiro a massa da água depois de 9 minutos, passo-a na frigideira grande para misturar o azeite, o bacon e o peperoncino. Despejo nela 3/4 de xícara da água quente em que cozinhou a pasta, transfiro tudo para um bowl de louça previamente aquecido, despejo a mistura de creme de leite e ovos, mexo rapidamente, e sirvo imediatamente.

- Wair, este carbonara apimentado está uma delicia.
- E eu já tentei explicar que isto não é "um carbonara".
- Bem, tem macarrão, ovos, queijo...
- Se um pato nascer num estábulo isto faz dele um cavalo?
- Deixa de ser purista! Agora que cismou que é "chef"...
- Não sou chef, sou cozinheiro. Mas sei a diferença entre a receita original e isto que fiz - ou cometi, sei lá.
- Bem, eu tenho que dizer - este seu Papardelle Alla Non Carbonara está uma delícia.
- Ok. Batizaremos este prato de "questo non é un carbonara", o Wair fica feliz, a gente também, e o tal do Carbonara, que eu nem sei quem é, não reclama...
- Dio Mio, cozinhei para ouvir isto...
- Aproveitando: vai rolar uma sobremesa também? Vi um pedaço de goiabada na geladeira...

sábado, 30 de julho de 2011

particularidades, sintonias, disparidades

Saí cantando Heaven, I´m in Heaven, porque fui deliciosamente citado por uma pessoa que escreve muito bem sobre o assunto - Nina Horta, em seu blog. Li seu livro "Não é Sopa" há muito, logo após ter lido "Um Alfabeto para Gourmets", de M.F.K.Fisher. Muito embora tenham formas literárias distintas, escrevem com uma qualidade atemporal sobre um assunto que tinha tudo - no passado próximo - de ser um tema "mulherzinha", mas ambas o fizeram (e no caso de Nina continua fazendo) com um caráter quase masculino, sem frescuras, mas nem por isto de humor e perspicácia reduzidos. Desde que montei este blog, e não faz muito, este é meu segundo aval considerável - o primeiro foi do Bérgamo, carinha que escreve bem e tem umas fotos em seu blog que me irritam, de tão bem tiradas, iluminadas e de composição sempre precisa.
Sei que a diferença de Ego para Cego é apenas uma consoante, e não vou deixar que isto me domine, mesmo porque acho que ainda falta um tanto para chegar aonde quero.
E eu estava em Recife quando vi este post, então a mistura de céuazulmarverde da minha janela, junto com este "evento" e mais alguma coisa, me inspiraram a fazer algo que ela (Nina) me adverte : trabalhar no imprevisto, investir no acaso.  Achei que ninguém queria ver fotos de pratos que deram errado,
ler sobre a receita do bolo que solou ou do jantar equivocado, apesar dos esforços. E vi que contrariava meu próprio dogma, onde afirmo preferir Toddy ao Tédio. Em viagens, o que dá certo é ótimo. Mas o que dá errado e com final feliz geralmente nos municia de muito mais lembranças. Portanto, vamos doravante enfiar o pé na jaca, escorregar no quiabo, pisar no tomate y otras cositas más.
Começando por aqui, em Recife, onde ganhei uma linda cuzcuzeira de alumínio tamanho "coupèe" - instrumentomais do que propício para um experimento.


Nunca tinha feito cuscus pernambucano, com leite de coco como manda o figurino, e desta volta quase que viciei neste prato feito no Parraxaxá (de onde tirei esta foto),
 granulado e soltinho, com a medida certa de sal e açúcar, um pouquinho de leite de coco, e não precisa de mais nada. Tentei pegar a receita direitinho com a simpaticíssima Ruth, cozinheira de mão cheia que, de início, evitou me dar dicas, com o melhor dos argumentos : "...se eu te disser tudo, você para de vir aqui comer minha comida!" Argumentei que, quando eu estiver em Recife, não vou escapar dela, mas quando em Sampa...então recebi as dicas precisas, inclusive da cuscuseira que ela usava, diferente da minha. Esta dá a forma sensual do prato acima e é mais segura, conforme me informou Ruth brejeiramente. Adorei ela.
Óbvio que, ao contrário de minha experiência com o mingau de tapioca citado no post anterior, errei nas quatro duas primeiras vezes que tentei fazer. Da primeira vez a água subiu demais, enxarcou tudo eo que era para ser uma iguaria virou uma coisa mais adequada para calefação e solda de canos e rachamento de diques. Da segunda, virou uma farofa desidratante. Sim, porque a pessoa que se arvorasse a experimentar aquilo ia desidratar subitamente, como num filme de ficção. Na terceira tentativa, quase. O problema do quase é ...o quase. Quase bom, quase ruim, quase com gosto, quase sem gosto. Na quarta tentativa, aí sim, algo próximo ao que tinha comido. Não, ainda não estava igual. Mas estou apenas começando nas diatribes e delícias pernambucanas, ainda não sei fazer a Cartola perfeita (doce de banana com queijo manteiga, açúcar e canela), não sei fazer Caldinho de camarão nem de peixe como eles fazem e considero que queijo de coalho na praia tem, definitivamente, outro gosto, diferente do que levo para casa. Mas todo caminho começa com o primeiro passo. Com a primeira queimadura, no caso. Porque fazer cuscuz não é para qualquer um não, exige elegância, bravura e espírito. Não é comida para fracos, não. Digo isto com 5 band-aids nas mãos.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

naninha, mingau & outras compensações

Não foram duas boas semanas, fisicamente falando. Uma tosse intermitente, chatinha, me levou ao médico. Diagnóstico - infecção das vias respiratórias. Um pouco de antibióticos deram conta do recado, mas em seguida, um mal-estar de proporções bíblicas me levou novamente ao médico em menos de uma semana. Diagnósticos : sinusite e estafa. Pelamordosdeuses, estafa é o diagnóstico mais comum para homens de minha idade que não tem a conta bancária de um Eike ou de um Bill. Mas esta estafinha me derrubou. Não tinha vontade de nada - nem de comer, nem de cozinhar, ler, ver TV, internet, George Clooney, eu não queria nada que não fosse minha cama e os cobertores. Um frio ancestral me dominava e me mantinha preso à cama, um torpor, uma moleza, uma incapacidade até de pensar. O copo d´água ao meu lado, e o braço não queria se mexer, a não ser na última hora. Fora a inapetência, a falta de vontade de tudo.
Aí lembrei que as crianças têm um apoio "moral" nestas horas - a tal da naninha.
Um misto de rito de passagem pela supressão da chupeta, com todas suas óbvias interpretações psicanalíticas, e também uma coisa fofinha para a criança ficar mais calma e segura. Mas não tem para adulto...E eu descobri que eu precisava de uma espécie de naninha, algo simbólico que me acalmasse (e não fosse Rivotril) para que eu tivesse a certeza de que aquele mal-estar era passageiro, de que aquele estado de torpor era temporário e normal sob algumas circunstâncias. Mas como não tinha este objeto para focar minhas deficiências, esperei até melhorar. E esperei, e continuei esperando quase até hoje, quando, pela primeira vez, me senti próximo ao normal. Não deixei de trabalhar quase nenhum dia, mas o tempo em que estava em casa, estava na cama, o único lugar razoavelmente confortável e aconchegante para minha situação.
Mas se o corpo é um universo misterioso, a mente mais ainda, mas atende aos sinais deste primeiro. Hoje trabalhei com mais foco e afinco, e ao chegar em casa, me deu vontade de uma coisa básica, que me levantasse, fisica e moralmente. Nada muito complicado, que me obrigasse a ficar horas na cozinha. Queria um alimento ancestral, que suprisse as minhas necessidades físicas, e que ao mesmo tempo me reconfortasse, afastando-me daquele auto-tédio a que tinha me imposto. O resultado foi uma forma de "naninha" : um mingau. Um delicioso, quente, reconfortante mingau de tapioca, preparado em poucos minutos, mas cuja preparação me provocou excelentes lembranças, de um tempo em que alguém colocava a  mão em minha testa para ver se eu estava com febre, e trazia um chá com torradas e geléia, uma sopinha quente e cremosa, um mingau...
Não foram semanas agradáveis, eu estava enjoado, chatinho e chateado, com uma moleza absoluta e uma inapetência fora do comum para mim. Mas subtraíram fantásticos três quilos de meu peso total, então no final valeu a pena. Já voltei ao blog e à internet, cozinhei, li, vi House, e se o George Clooney aparecer, vai ser muito bem recebido.
 
Mingau de Tapioca
2/3 de xícara de tapioca flocada
2/3 de xícara de água fria
1 e 1/2 xícaras de leite desnatado
1/2 xícara de leite de côco
1 colher de sobremesa de manteiga sem sal
2 colheres de sobremesa de açúcar
1 pauzinho de canela
canela em pó

Coloque a tapioca de molho na água em uma tigela ou prato fundo por aproximadamente 20 minutos. Reserve. A tapioca vai inchar e absorver toda a água. Aqueça em fogo baixo o leite, adicione o leite de côco e o açúcar, a manteiga, a canela em pau e a tapioca. Mexa sobre o fogo baixo por aproximadamente 15 minutos ou até engrossar. Sirva quente polvilhando canela em pó.


terça-feira, 5 de julho de 2011

V E N D E T T A

Almoço hoje não existiu. Tracei uma maçã da Mônica (sim, isto existe, vem num saquinho com a figura da...acho melhor não explicar), um iogurte "série especial" supostamente de mamão e cereais, mas que na verdade era meio cor de mamão - na cartela de tintas da Suvinil -, e umas coisas dentro meio murchas que pareciam asas de algum inseto, tudo mascarado por um sabor de baunilha sintética. Aí abro o Facebook e vejo no meu mural uma foto de Sr. M de um prato de canjica com canela polvilhada, onde ele me provoca dizendo que ela tinha sido recém feita e consumida ainda morna. Raiva. Ódio. Gula. Inveja. Quantos pecados capitais ainda faltam? Aí entramos numa discussão com Lord N pois eu falava que a canjica do Nordeste se chama curau no Sul/Sudeste, nome considerado brega em comparação aos nomes tradicionais do Nordeste Brasileiro. Sou forçado a concordar - canjica é mais nobre que curau. Assim como munguzá, carurú, vatapá, nomes ancestrais. Portanto, discussão definida, até que  Lord N  alega informa ter almoçado foie gras com frutas vermelhas. Raiva. Ódio. Gula. Inveja.
Mas o mundo dá voltas...
No final do dia, a caminho para casa, recebo um telefonema de Sr. B, dono da empresa para qual trabalho, convidando a mim e a Eduardo para jantarmos em sua casa. Uma boa surpresa, e irrecusável, por alguns motivos.
1º) Não recuso jantares do Sr. B e da Sra. D, sempre como e bebo muitíssimo bem, o papo rola solto e a noite é ótima.
2º) Não tinha nada pronto em casa, e não tinha almoçado, lembram?
3º) Não se recusa jantar na casa do dono da empresa para qual trabalha.
Ao chegar na casa, o perfume denunciava. Um tartuffo de aproximadamente 10 cm de diâmetro repousava num prato esperando sua hora de aparecer. A surpresa era um cardápio fundamentado neste fungo subterrâneo, totalmente capitaneado por Sr. B, que se esmerou nos pratos.

Per cominciare - insalatta de Mâche com tartuffo . Simples, clara.

Secondo piatto - Uovo com tartuffo. Um clássico. De novo, simples, fantásticamente simples.A gema laranja, escorrendo sobre o prato, um sal negro defumado. Sabores e aromas casados.
Ainda - uma polenta com ragu de cogumelos, grana padano e tartuffo. Uma pequena ode à caloria. Mas...
E para finalizar o conjunto, queijo branco com mostarda di cremona.
Dizem que a vingança é um prato que se come frio. Não, se come frio, morno, quente, e com tartuffo.
Sr. M volta a me provocar nesta rede social afirmando declarando que após a academia, Pilates e esteira comeu apenas frugais frutas. E eu cheio de vinho e calorias.
Acho que ainda devo uma vingança - ele deve estar magro a esta altura. Três dias de regime me esperam...

sábado, 2 de julho de 2011

crunch crunch, gasp gasp, coff coff

No início, era o grão. Amarelo, lisinho, brilhante. Aí, aconteceu o inevitável - a paixão deste pela gordura quente. E  o grão, que parecia seco, tímido, revela um interior úmido, e a contato desta ardente gordura, não aguenta sua pressão interna e explode revelando um interior rico, voluptuoso, barroco, um universo em expansão até então contido por uma fina membrana. Bastou a paixão quente para revelá-lo como pipoca.
Não gostar de pipoca é quase uma falha de caráter. É viciante, deliciosamente viciante - se bem feita. O processo de estourar milho é quase uma sinfonia. Começa suave, quase um adaggio, um estouro aqui, outro ali, iniciando um allegro.Aí, num crescendo, até alcançar um presto, um prestíssimo, culminando numa volta ao silêncio, o final do movimento, com um ou outro milho teimoso que ainda não quis revelar seu interior pipocando solitariamente, até o final. Aplausos!
No post anterior, falei de uma pipoca aromatizada com pimenta e curry, e coincidentemente logo após este post conheci dois empresários do ramo que me informaram haver vários tipos de milho para pipoca, com formatos exclusivos, coisas que desconhecia completamente. Bateu curiosidade... Aí a rede me serviu de base para o que já tinha visto vagamente - pipocas aromatizadas, numa variedade absolutamente inacreditável.

Nos site Popcorn Palace e no maravilhoso 479º os sabores variam de acordo com o tema. Temos, por exemplo: caramel nut, cookies and cream (com pedacinhos de biscoito oreo...devia ser passivel de penalidades  inventar uma coisa destas), cheese caramel, pecan praline, cheese caramel, versões salgadas com fleur de sal (vou fazer em casa ESTA NOITE!),cinnamon spice, pink himalayan salt & pepper (vou fazer esta também , com o sal que comprei no PÃO), ginger sesame caramel - ai, esta promete..., black truffle e outras tantas, cada uma mais instigante do que a outra.
Portanto, vou copiar a Julie do filme/livro Julia & Julie - como sou popcorn addict, vou experimentar todas as receitas que chegarem às minhas mãos desta variante gastronômica. Vou transformar minha cozinha num laboratório popcorniano.Vou criar novo métodos de estourar pipoca, vou ganhar montanhas de dinheiro com isto, vou incorporar Dr. Strangelove, vou dominar o mundo com a força explosiva da pipoca!
...Caindo na real, acho que vou apenas engordar mais um pouco...

sábado, 18 de junho de 2011

SINGING IN THE KITCHEN

A música exprime a mais alta filosofia numa linguagem que a razão não compreende, afirmou Schopenhauer. E eu não consigo disassociar o ato de cozinhar com ouvir música. Levo meu laptop para a cozinha, vejo e mexo nas receitas, escolho e mudo as músicas, cozinho, bebo, tudo ao mesmo tempo agora. Por causa disto,minha cozinha é animadíssima, e ouvi esta confirmação de uma amiga em uma reunião. Mas, voltando ao tema, outro dia mudei o cardápio em virtude de ter sido influenciado pela trilha sonora, bastante animada, solar, que me provocou ímpetos de rever todo o meu projeto do jantar para literalmente outra praia - ia fazer massa, acabei fazendo peixe.
Refletindo sobre isto, pensei - qual seria a trilha sonora perfeita para cada prato, ou melhor, o que combinaria com alguns temas musicais? Como o assunto poderia render um post de algumas páginas, decidi restringir a algumas vozes femininas mais ou menos novas, que tenho escutado bastante ultimamente. Comecemos com Rumer (gracinha, diria a apresentadora), também alcunhada de "a nova Karen Carpenter" - porém não anoréxica, como vocês podem conferir pelo vídeo.



Ouvi Am I Forgiven montando um prato de presunto cru com fatias de melão e folhinhas de endro, enquanto abria e provava um delicioso Cloudy Bay, um sauvignon blanc fresco como a voz desta cantora. Harmonizou direitinho.


Dionne Bromfield com Yeah Right (#gracinha 2! - vídeo aqui), a inglesinha de apenas 15 anos, "amadrinhada" de Amy Winehouse renderia um drink mexido. Não, chacoalhado, para acompanhar o ritmo deste single. Suco de abacaxi, vodka, gelo picado na coqueteleira, e uma insólita pipoca feita com um pouco de curry e um tico de pimenta de cayena. Pulei horas...


Betty Ditto, vocalista do Gossip, apareceu outro dia numa escolha randômica do laptop, com HEAVY CROSS. Fazia tempo que eu não a ouvia, e decidi ficar nela e seu som balançante.Eu batia os pés no chão e as mãos freneticamente começaram a picar pepinos, cebolas, tomates, aipo, erva doce, fui picando e me acabei numa salada , enquanto um hambúrger chiava na grelha enfumaçando a cozinha toda. Shots da excelente vodka Belvedere durante a confecção dos pratos. Meu cachorro Leopoldo olhava tudo com uma cara esquisita..


Adele ultimamente tem lugar marcado na minha playlist. E quando ela canta SOMEONE LIKE YOU eu me acabo. Acabo fazendo um bolo de chocolate com café, denso como a voz desta cantora. E me acabo comendo o bolo também, depois de ter traçado algumas cervejas escuras Guiness e uma John Smith. Ainda bem que não sei fazer kidney pie...Ia ser expulso de casa ao manipular rins de carneiro para a torta.


Tomei um - aliás, dois - dry martinis ouvindo Stacey Kent cantando MY HEART BELONGS TO DADDY. Tomei o terceiro. E comi o vidro de azeitonas verdes. Como consegui abrir o vidro até hoje não sei, dado o teor alcóolico que esta música me provocou...


Não sei porque, mas Sharon Jones me inspirou a fazer...bolinhos de chuva. Sim, daqueles fritos, passados no açúcar e canela. Uma caneca de café quente, pelando, e uma baciada de bolinhos de chuva ouvindo IF YOU CALL. Se eu continuar ouvindo esta música, e comendo bolinhos desta forma, ninguém vai me chamar mesmo...

Já o álbum Archandroid, de Jannele Monae, é quase bipolar - tem de tudo um pouco, mas muito bom da primeira à última faixa. Combina com quase tudo - de feijoada a sushi...Porém, a faixa COLD WAR provocou uma omelete com claras em neve, batidas no ritmo da musica e que transformaram este prato numa versão souflèe, alta e fofa.

And last but not least, procurando algo  na rede enquanto fazia um ragu, acabei achando Amy Whinehouse numa mega tocante interpretação de LOVE IS A LOSING GAME. A performance é de cortar os pulsos com faca ginsu...Tomei um bom trago de Wild Turkey, mas o que combina mesmo com esta gravação é...cicuta.

sábado, 11 de junho de 2011

O REI ESTÁ NU

 
Depois de reclamar das embalagens de biscoito Maizena no post anterior, tive que voltar ao tema. Aliás, ao produto, pois descobri que este biscoito tem propriedades calmantes. Sim, garanto - e quem me disse é completamente abalizado, um doutor no assunto. Meu afilhado Raphael, de 3 anos.
Bem, melhor explicar...
Estava no supermercado e encontrei com meus compadres Cris e Rodrigo, com a prole (Thomas e Raphael) e a Zazá, fiel escudeira. Quando passamos pela gôndola dos biscoitos, Zazá me atiçou - "Pergunte ao Rafa o que é isto", colocando em minhas mãos um pacote deste biscoito. Eu, babão como bom padrinho, passei pelo seguinte diálogo:
- Rafa, o que é isto?
- É para o Rafa - ele me respondeu.
- E para que serve?
- P´ra me acalmar...
Como na história da Roupa Nova do Rei, onde uma criança desprovida de preconceitos ou dogmas declara uma verdade irrefutável, meu afilhado confirmou o que eu sempre achei - confort food tem propriedades terapêuticas. Prego as qualidades de um mingau quente polvilhado com canela sempre que estou fraco - ou carente. O prazer de comer um simples bolo quentinho pode fazer mais pelo espírito do que muita refeição exageradamente elaborada. Um capeletti in brodo aquece a garganta - e este calor vai se espalhando pelo corpo, irradiando energia como um gerador de última geração.
E esta epifania aconteceu justamente hoje, quando pensava em fazer uma Sheppherd´s Pie, prato masculino, calórico e recompensador. Mas ao chegar em casa decidi mudar o cardápio, pois queria comer algo um pouco mais leve - e simples. Decidi fazer um simples hamburger grelhado, com cebolas grelhadas e uma versão da salada de batatas que adoro, e sirvo morna, rapida e fácil. Não tem medidas absolutistas, é mais uma mistura ao gosto do freguês, mas todas as vezes em que servi este prato em casa, fiz sucesso. A simplicidade encanta. Clarice Lispector afirmava: "Ninguém se engane - só se consegue a simplicidade através de muito trabalho." Nem sempre. Mas em tempos de culinária molecular, tecno-emocional, o simples pode ser mais sábio - e paradoxalmente, promover sensações mais complexas.
By the way , fiz o teste - comi alguns biscoitos Maizena (os que estavam inteiros, detesto os quebrados como já disse), e fiquei mais calmo. Raphael é um sábio.
Salada Morna de Batatas  Cozinhe as batatas com casca, tire da água - deixando uma ou duas para cozinhar um pouco mais, para que desmanchem um pouco ao misturar. Descasque e corte as batatas em pedaços médios, acrescente bastante alho-poró cru em rodelas finas (vou da parte branca até a parte verde clara), um alho espremido, uma colher de mostarda Dijon, bastante Dil picado, sal, azeite de oliva virgem e pimenta do reino moída na hora. Misture tudo e sirva imediatamente, ainda morno.



sábado, 4 de junho de 2011

DUAS MÃOS ESQUERDAS

Tenho poucas manias. Das confessas, uma delas é detestar biscoito (ou bolacha, dependendo da região) quebrada. E não sei quem foi o cão infiel que desenho a embalagem de biscoitos Maizena, por exemplo. As chances de abrir o pacote e não quebrar os primeiros quatro ou cinco biscoitos são infinitamente menores do que ganhar sozinho na Mega Sena e ainda por cima receber o prêmio das mãos do Brad e da Angelina. E ultimamente, ou mudaram a fórmula deste biscoito, ou ele definitivamente foi feito para quebrar. Do primeiro ao último exemplar, sobrando dois ou três inteiros para manter a regra.
 O mesmo acontece com biscoitos Waffle, poderiam vender eles já moídos, economizaríamos tempo, unhas e dentes. Poderiam colocá-los em saquinhos iguais aos de farinha, já que parece que eles foram feitos para empanar algo, e não para receber mordidas em busca de alguma relevância. Apesar de adorar o conteúdo, odeio com todas as forças algumas latas de sardinha. Um pequeno anel de metal segura a tampa. Ele deve ser torcido com delicadeza e determinação para trás, e depois com o ritmo solicitado a um joalheiro puxar o conjunto tampa/anel para que a tampa toda se rasgue ao puxarmos esta armadilha, sob o risco de 1)quebrar o anel/alavanca ou 2)cortar a mão, o dedo e manchar a roupa, pano de prato, prato, pia e o cachorro deitado na cozinha de sangue. O suco de cranberry do qual minha geladeira é dependente (não fica um dia sem) também sofre de design disfuncional. Uma tampa de plástico esconde um selo metálico que só sai com reza brava, requisitando o auxílio dos deuses da coordenação motora. Nem vou falar de alguns vidros de mostarda ou catchup pois estes foram definitivamente feitos para não funcionar. São frascos mesquinhos, não querem dividir seu conteúdo com ninguém. Isto depois de reclamar no último post sobre a troca de embalagem do Sonho de Valsa por algo até agora inexplicavelmente complicado.
Se existe um inferno para estes designers da complicação, espero que eles sejam eternamente condenados a abrir a embalagem de infinitos CDs (ainda tem gente que compra, aproveitem...) com duas mãos esquerdas, apenas para perceber que todos estes contém apenas CDs de Axé ou o último discurso do Deputado Tiririca, com apartes do Maluf.

sábado, 28 de maio de 2011

COISAS QUE PERDEMOS PELO CAMINHO II

Pensava ontem à noite no ótimo post do Blog do Bérgamo, sobre como as coisas ficaram complicadas num dado momento. Tudo o que é simples no universo da gastronomia & seus congêneres está caindo em desuso. A análise de um simples copo americano neste ótimo texto pode se expandido para todos os setores deste segmento, onde comer ficou uma complicação. E tome espumas, alimentos modelados para parecerem outros (me recusei a comer uma cenourinha feita não sei do quê em um restaurante recentemente), comidas imatéricas - do ponto de vista gastronômico I´m a Material Man, ok? - pratos tão elaborados que, se o comensal iniciar a comê-lo de uma forma que não foi a que pensou o criador deste, arrisca levar uma bronca do Mâitre, e coisas quetais.
E eis que hoje, em virtude de ter ido comer uma coxinha comentada num restaurante no Baixo Augusta, que me garantiam as redes sociais estar aberto - e que não estava, óbvio! - acabei (ou melhor seria dizer ME ACABEI) na Rostisserie Bologna, antiga casa paulistana que serve frango assado, lagarto a vinagrete, cuscus paulista & otras receitas clássicas de nossa culinária. Pedi na hora uma coxa creme,
 iguaria que acrescentou dígitos à minha silhueta desde tempos da faculdade no Mackenzie. Quando ela chegou, estranhei - cadê o ossinho que segurava a coxa? Olhei no expositor e todas as coxinhas estavam nesta nova versão, mais clean, mais "sofisticada"...Será que ninguém pensou que a carne junto ao osso, quando assada ou cozida, tem um sabor inigualável? E que segurar a coxinha pelo ossinho, além de tudo, remete a tempos imemoriais, quase pré-históricos, reafirmando nossa masculinidade?
Como ainda pedi um camarão empanado - este sim original até o rabo (literalmente falando, ok?), e um pequeno cuscus para arrematar (por favor, evitem as imagens de duplo sentido nesta frase...), achei que se redimiram no conjunto da obra. Ao pagar a conta, decidi finalizar esta refeição de modo coerente - pedi um Sonho de Valsa, que não comia há muito.

Tentei abrir a embalagem como de costume, e não consegui. Nova tentativa, novo erro. Pânico...Será que o velhinho alemão se apoderou de mim?  Estaria com algum transtorno miotônico (sempre quis usar isto, sorry...), havia perdido a coordenação dos movimentos, O QUE ESTAVA ACONTECENDO?? Entrei no carro, respirei fundo, tentei isolar o meu ser interior do exterior barulhento para rever a ação, e então olhei fixamente para o bombom. Cuja embalagem tinha mudado de forma! Não era mais um papel celofane rosa envolvendo um aluminizado, era um trangênico, um pacotinho que imitava a antiga embalagem. Tive que usar os dentes para desembalar o conteúdo, engolindo nesta ação um pedacinho do papel que vai ficar grudado no meu esôfago por alguns anos...Depois disto, nem posso garantir que o sabor era o mesmo, juro. Tinha ficado tão irritado intrigado com isto, que perdi o prazer da mordida.
Algumas coisas não deveriam mudar, permanecer eternamente iguais, como a Torrada Petrópolis do Aeroporto Santos Dummont, inalteradamente gordurosa e deliciosa ao longo dos tempos, a segunda melhor coisa deste aeroporto carioca - a primeira é a vista, claro.
Meu mestre Mies Van Der Rohe pregava "God is in details". Sou agnóstico, mas aceito a frase de bom grado, e prego que, se Ele está nos detalhes, o Anjo Caído está no excesso destes. Talvez o básico irá nos salvar, o simples nos redimirá. Aleluia, irmãos!

quarta-feira, 25 de maio de 2011

THINGS THAT INSPIRE US

Cansado do universo corporativo. Uma realidade cheia de pessoas que não mereciam esta denominação - pessoas. São apenas um grande, absurdo desperdício de DNA, imensos conjuntos de células amalgamados em uma estrutura cujo principal propósito será o de prejudicar alguém, atingir os objetivos de modo mais acintosamente vil e mesquinho, dando uma nova dimensão aos conceitos de vilania e mesquinhez. Onde a palavra ética é apenas um verbete situado entre éter e etílico. Um sistema construído para o erro, para julgamentos imprecisos, uma dimensão onde o valor real é diametralmente oposto ao observado e cultuado, um lugar de desvios infinitos e recursos ilimitados em prol de um significado que não significa, nada significa. Onde o gênero humano tem muito mais de gênero do que de humano.

Não, não quero me isolar do mundo e cultuar uma nova realidade onde a competição não exista, uma realidade utópica onde todos serão iguais, bons, éticos e generosos.  Quero apenas encaminhar minha vida para um estado mais verdadeiro, cercado de coisas e pessoas que me inspirem.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

AQUECIMENTO INTERNO

Preguiça imensa de acordar ultimamente. Sair da cama com este friozinho é uma tarefa digna dos trabalhos de Hércules, para este que ainda é acompanhado de um cachorro igualmente preguiçoso - confiram Leopoldo em seu momento "daqui não saio, daqui ninguém me tira"...

Eu, morto de inveja, saí para o trabalho deixando em casa um cachorro quentinho no meio do meu cobertor (sem duplo sentido ou interpretações dúbias nesta frase, please...) sendo que tenho absoluta certeza de que ele não sentiu nenhuma culpa em me ver sair nestas condições adversas, visto que ele continuava usufruindo do que EU deveria ter direito.
O dia foi cheio, eu tinha um almoço num lugar que adoro (Varanda - as melhores carnes de SP!) e que para variar não desapontou - ou melhor, foi um almoço ótimo, vinho impecável e excepcional companhia, com o papo rolando solto como prometia. 
Sabendo prevendo que eu ia exagerar no almoço, tinha deixado uma sopinha semi-pronta para terminar hoje, que considero revigorante e deliciosamente caipira - Sopa de mandioca com linguiça - por sinal, isto não é uma receita, é praticamente um tratado de termos com duplo sentido...
É o tipo de comida bom para este tipo de ocasião - frio, lareira, vinho tinto, pão (tudo light, claro). Coloco na minha cabeça que este tubérculo é proteína pura, e que não saí do regime ingerindo estas calorias. Procuro nos meus livros uma teoria que prega as virtudes da comida quente para perdermos peso - quem foi o maluco que escreveu tal coisa? Tento me convencer que pelo simples fato de ser sopa e não ter que mastigar nada muito sólido esta refeição não acrescentará dígitos à minha circunferência - ledo engano. Acompanharam calóricas fatias de ciabatta e uma taça do bom Sophinia Reserve, para piorar os números dos Vigilantes do Peso. Mas - what the hell! Baby, it´s cold outside!




Sopa de Mandioca com Linguiça de Lombo

2 colheres de sopa de azeite de oliva virgem
500 gramas de mandioca limpa
200 gramas de linguiça de lombo
1 cebola finamente picada
1 talo de alho poró cortado em rodelas finas
1 talo de aipo cortado em pedacinhos
1,5 litro de caldo de legumes caseiro
1 cálice de vinho do porto branco seco
sal
pimenta do reino branca moída na hora
salsinha

Escalde rapidamente as linguiças em água quente, tire a pele e espedace-as com os dedos.Aqueça o azeite, refogue a linguiça durante 3 minutos, acrescente a cebola e o alho-poró até que estejam ligeiramente dourados, acrescente o vinho do porto, espere evaporar. Adicione a mandioca em pedaços médios (que caibam numa colher de sopa, claro!) e refogue em fogo médio até que eles adquiram uma cor dourada. Acrescente o aipo e o caldo de legumes, espere ferver, diminua o fogo, tampe e cozinhe por aproximadamente 90 minutos em fogo bem baixo, até que a mandioca fique quase desmanchando. Verifique o sal, acrescente a pimenta do reino , misture a salsinha e sirva imediatamente.

domingo, 8 de maio de 2011

L I B E R T Á


Almoço no Charleston Ristorante, ainda Milano. Tarde ensolarada, fez frio de manhã mas o sol abriu na cidade, e multidões de ternos irritantemente bem cortados e sapatos polidos caminham pelo Corso Vittorio Emanuele, enveredam pelas ruazinhas que circundam este centro histórico e acabam sentando em algum lugar para comer, beber, um café ou sorvete, eu entre eles. Decidi por este restaurante em virtude de suas mesas sob ombrelloni, ao ar livre. Acabei me sentando na primeira fila das mesas, com o sol às minhas costas, o que derrubou um pouco meu look - tive que tirar o paletó, cujo lenço no bolso acabara de comprar e demorei meia hora para deixar perfeitamente desarrumado - afinal, não gosto do look impecável. E para não derreter sob o calor milanês, pedi imediatamente uma garrafa de água e um vinho branco. Quase fui na cerveja, mas como quero demorar na refeição, não arrisco ficar com a taça vazia optando pelo vinho.
Ao meu lado, uma mesa com três elegantes mulheres que almoçam uma tagliatta, a outra uma salada e a terceira, ousada, pediu alcachofras grelhadas de entrada e uma pizza de prato principal. E ainda é magra, a criatura! Conversam o tempo todo, esperando que o gringo aqui não entenda o que elas falam. Lamento desapontá-las, meninas, mas entendi tudinho! Obrigado pelos comentários, by the way...
Um pai chega com seu filho, o pai elegantíssimo em seu look quase invernal mas de cores claras, portando belos óculos de sol de tartaruga e lentes verdes, sem nenhuma inicial ou griffe em sua estrutura, corroborando o que já tinha percebido - elegância nem sempre é um gene transmissível. Seu filho, coberto de grifes, com um cabelo exageradamente arrumado e artificialmente clareado, sobrancelhas perfeitas (nem a Nicole Kidmann tem sobrancelhas tão delineadas!), tudo novo, brilhando, espelho dos novos jogadores de futebol europeus.
À minha direita, mãe e filha discutem o fato de estar em Milão - aliás, desencantadas da cidade, cheia de turistas e gente que se dispõem a ficar na fila para entrar numa loja como a Abbercrombie - aliás,  imensa. A mãe argumenta que nunca viu uma fila daquelas em frente ao La Scalla, sinal dos tempos. Concordo com ela - quem se dá ao displante de ficar numa fila enorme para comprar camiseta, IPad, IPhone ou qualquer coisa destas está dando sinais claros de que o gênero humano tem muito mais de gênero do que de humano. Dividem a mesma salada que eu pedi e uma pizza também. A filha pediu uma cerveja que está com uma cara ótima, mas meu vinho está dando conta do recado direitinho.
Um brasileiro e seu - como dizer... - acompanhante, vinte e cinco / trinta anos mais novo, chegam ao local cheio de sacolas - várias da loja que acabei de citar. Óculos de griffe, sapatos combinando, camiseta com marca brilhante, relógio imenso, colar - ou seja, look "não sei de onde veio, mas está claro onde quer chegar...". O rapaz, por deformação profissional, apesar de estar acompanhado, tira os óculos e examina atentamente o local, quero dizer, os locais, para confirmar que está fazendo um bom negócio. Discretamente acaba me examinando de alto a baixo, e quando verifica que não estou carregando nenhuma sacola e não porto nenhuma marca reconhecível (para ele), conclui que realmente está fazendo um ótimo negócio, e volta o foco para seu cliente acompanhante. Sábio rapaz.
A tarde está quente, eu estou quente, o vinho começa a ficar quente também. Peço um balde de gelo para resfriar o Pinot Grigio e penso no post de um dos meus blogs preferidos (aqui) sobre a sutil arte da escuta da conversação alheia, e acho que estou chegando perto da perfeição proposta neste muito bem escrito post. A comida? Estava ok, nada especial - pedi uma salada que me desapontou, as alcachofras
 (copiei da vizinha) estavam muito boas, o vinho já conhecia. Mas as conversas e o ar da Piazza Del Liberty foram o melhor desta refeição.






(escrito em maio,29)
ps- tks Sandro pela dica!